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JOSÉ SARNEY
Desatar os nós
NÃO HÁ mais diagnósticos a
fazer nem cabe especular
sobre as causas, concausas
ou delírios. O Brasil tem uns nós a
resolver e pedras, não no meio do
caminho, mas obstruindo o caminho. Afastemos os julgamentos
pessoais. Vamos dar uma pausa no
hábito nacional de jogar pedras.
Para abreviar o julgamento, vamos
generalizar, mesmo com o risco de
estarmos errados: somos todos
responsáveis.
A verdade é que o nosso modelo,
que vem dos primórdios do século
20, é de concentração de renda, de
sublimação dos extremos de riqueza e pobreza que se exerce sobre
pessoas, famílias e território. Nele,
as regiões pobres e esquecidas do
país serviram de abastecedoras de
matéria-prima barata, mão-de-obra pior ainda, para criar bolsões
de concentração de riqueza em determinadas áreas do Sudeste, que
terminaram na tragédia de quase
metade da população nacional viver em favelas, mergulhadas na miséria, na periferia das grandes capitais.
O presidente Lula é uma revolução política, porque concluiu o processo democrático de trazer a governar os operários, a classe que se
julgava afastada e para sempre
condenada a coadjuvante. Sua biografia e o apoio popular que respaldam sua última eleição lhe dão a
autoridade, que nenhum outro
presidente teve, de procurar um
terreno comum que possa reunir
não somente as forças políticas
mas todos os segmentos da sociedade para superarmos os entraves
que estão aí, atravessando todos os
governos e todas as vontades.
O primeiro deles: a modernização política. Não se pode ver o contraste da máquina eletrônica apurar a eleição em três horas e convivermos com práticas da República
velha e mecanismos que remontam ao século 19.
Não se pode continuar com a situação de penúria do Nordeste e
sem nenhuma perspectiva para a
Amazônia, mergulhada na sua solidão histórica.
Os obstáculos de um corporativismo obstrutivo e uma burocracia
arcaica e bolorenta. Temos de enfrentar o problema de distribuição
de renda e de estrangulamento pela especulação financeira. Temos
de crescer e, para crescer, temos de
ter energia, indústrias de base e
descentralização de riqueza.
O presidente Lula inverteu as setas. Não se fixou na prioridade econômica e foi fundo nos programas
sociais. São um colchão para evitar
a explosão. Mas é preciso avançar
muito mais. Ter a coragem de desatar os nós. Libertar-se das peias
ideológicas de alguns, punir os que
o traíram, traindo o seu governo,
fazer um chamamento para que se
faça uma cruzada nacional acima
de tudo e de todos e erigir como sua
protetora no segundo mandato
Nossa Senhora Desatadora dos
Nós.
jose-sarney@uol.com.br
JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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