São Paulo, domingo, 4 de janeiro de 1998.



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RECUO NA ABERTURA

O governo federal anunciou, em meio ao burburinho das festas de fim de ano, uma das mais importantes mudanças em sua política industrial dos últimos tempos. Foi reduzida a lista de máquinas e equipamentos cujas importações eram beneficiadas por tarifas mais baixas -conhecida como regime de "ex-tarifários".
Houve um longo período entre a suspensão da lista antiga, anunciada em julho de 97, e a divulgação da nova. A mudança pode ser tomada como exemplo dos exageros cometidos a partir do princípio de que abrir a economia é bom em qualquer circunstância. O regime anterior chegou a beneficiar 3.600 itens. Agora, a lista vai amparar com impostos de importação de 5% apenas 830 tipos de máquinas e equipamentos.
Essas alterações podem ser consideradas também como sinal de que questões tão importantes da política econômica são tratadas de maneira não muito segura, para não dizer com certo descuido, pelo governo. Afinal, desde 1996 discutiam-se o regime cambial brasileiro e temas como a dimensão mais recomendável da abertura econômica do país.
Se menos de 25% da lista original de produtos merece ser mantida num regime especial, o que parece ter havido antes foi, de fato, uma liberalidade não muito conscienciosa, justificada sob o lema da modernização fabril. Ou será razoável imaginar que já está concluída a reestruturação da economia brasileira, sendo portanto dispensável facilitar a entrada de equipamentos modernos? Ademais, a Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) levanta a hipótese de que houve fraude nas importações -equipamentos teriam sido comprados no exterior com abatimento indevido de impostos. Não é novidade a falta de consistência e de transparência no que se convencionou chamar de política industrial brasileira. Pode-se também imaginar que a revisão dos extremos da abertura leve tempo e que os técnicos do governo queiram ser agora mais criteriosos. Mas a denúncia de irregularidades no sistema, feita pela Abimaq, precisa ser apurada.
A redução da lista é notável. Ou se trata de um retrocesso na abertura, capaz de comprometer investimentos (conforme alegam setores afetados, como os de química e de celulose), ou havia irregularidades nas importações, fato igualmente grave que não pode ficar sem esclarecimento.
Mas há uma terceira hipótese, que não exclui as anteriores. Como quase sempre ocorre no Brasil, alteram-se as regras do jogo, em especial as que se referem a decisões de longo prazo (como é sem dúvida o caso das importações de máquinas e equipamentos), com os olhos postos no curto prazo. Ou seja, mais uma vez, em nome do compromisso com uma política cambial que vem há tempos sendo criticada, o governo federal estaria apelando para o casuísmo no controle das importações.
Seja por irregularidades no sistema anterior, seja por estar fazendo uma nova opção protecionista ou, ainda, por estar agindo em resposta às fragilidades do regime cambial, o governo federal continua devendo melhores explicações ao público.



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