São Paulo, quarta-feira, 04 de abril de 2007

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ANTONIO DELFIM NETTO

"Requiescat in pace"

PARA ALGUNS economistas a maior surpresa revelada pelas novas estimativas de crescimento do PIB foi o aparente aumento da Produtividade Total dos Fatores -PTF (mão-de-obra e capital). Trata-se de um "requiescat in pace" para essa misteriosa componente calculada como resíduo na contabilidade do crescimento.
O problema com o conceito de "produto potencial" é que ele é resultado de uma curva de oferta (de uma função de produção) produzida por um estoque fixo de capital (que a rigor ninguém sabe direito o que é) e por uma quantidade de mão-de-obra determinada, no mercado de trabalho, pelo encontro da oferta de mão-de-obra (os que podem e desejam trabalhar para cada nível de salário) com a demanda de mão-de-obra (determinada pela produtividade marginal do trabalho). Não há, no produto potencial, papel para o fator de produção decisivo: o empresário, como já sabia em 1725 o velho Cantillon. O empresário, mesmo no curto prazo, move-se por incentivos (perspectiva de lucro) e faz mover, com incentivos, a oferta e a demanda de trabalho, além de usar mais ou menos intensivamente o estoque de capital.
Oferta global e demanda global não são totalmente independentes, mesmo quando o estoque de mão de obra e o estoque de capital parecem fixos. Se houver "expectativa" de lucro (ou seja de mais demanda) o empresário mobiliza a força de trabalho oferecendo novos estímulos que aumentam o seu esforço, aumentam a participação feminina e aumentam a oferta dos "desacorçoados" (diminuindo o nível de desemprego). O mesmo acontece com o uso do estoque de capital que é mobilizado em novos turnos juntamente com a mão-de-obra, desde que haja "expectativa" de lucro. É claro que esse movimento tem um limite no estresse que vai produzindo na utilização do estoque dos fatores e que, na margem, pode elevar os custos.
Mesmo esses serão, em parte, compensados pelo inevitável aumento da Produtividade Total dos Fatores quando aumenta o nível da produção, como mostra a velhíssima lição de Verdoorn-Kaldor.
É por isso que a política monetária deve ser uma salada de "boa teoria" muito bem temperada com "arte" para não abortar a ação do empresário quando ele vê a possibilidade de expansão da demanda e de novos lucros. O uso abusivo de um metafísico "produto potencial" tornou-se um efeito constritor do "produto atual"! É inútil, mas indispensável dizer que isso está longe de sugerir transacionar um "pouquinho mais de inflação" por um "pouquinho mais de crescimento".


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ANTONIO DELFIM NETTO
escreve às quartas-feiras nesta coluna.


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