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CARLOS HEITOR CONY
O papel decadente do papel
RIO DE JANEIRO - "O papel não faz mais parte da minha vida". A declaração é de Bill Gates, montado numa
fortuna de 50 bilhões de dólares e tendo à sua disposição um computador
com três monitores que fazem dele o
maior agente e consumidor do mundo virtual. Além dos dólares e do
computador que montou para uso
próprio, ele usa um "tablet PC", que
substitui qualquer caderninho de notas, arquivo e provedor para outros e
para si mesmo.
De papel mesmo, acho que só não
substituiu ainda o papel higiênico
por um papel virtual -mesmo assim, não sei não, os gênios são capazes de tudo. Quando tem uma nova
idéia, escreve a anotação numa lousa
e depois a embute num programa
qualquer para ver no que vai dar.
Quando vai a uma reunião de trabalho, não leva papel nenhum e desdenha do executivo que puxa qualquer coisa parecida com uma agenda. Não quer dizer que ele odeie o papel, apenas não precisa mais dele.
Por obrigação profissional, já fiz
um levantamento do papel, desde os
papiros das margens do Nilo aos pergaminhos dos povos que usavam a
pele das ovelhas para escrever qualquer coisa. Sem esquecer as civilizações mais antigas que usavam blocos
de argila (tijolos) ou mesmo a parede
das cavernas em que moravam para
deixar recados: "Fui ali e volto já".
Entrevistei há tempos, num almoço, importante empresário do setor
de celulose, que, em certo momento,
em meio a uma digressão sobre a beleza e a utilidade dessa ferramenta
que levou a humanidade ao estágio
de civilização que conhecemos, deu
uma espécie de brado retumbante:
"O papel nunca vai acabar!".
O restaurante inteiro parou, os garçons pararam de servir, os clientes
pararam de mastigar. Vermelho, o
empresário repetiu "urbi et orbi", para a cidade, para o mundo e para o
restaurante em particular: "O papel
nunca vai acabar!".
Bill Gates não precisa gritar. Para
ele, o papel é tão inútil como uma escarradeira para quem não tem catarro a expelir.
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