São Paulo, quinta-feira, 04 de maio de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Em nome do fortalecimento do Supremo

JOSÉ JORGE

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal aprovou, na semana passada, projeto de minha autoria que introduz modificações na lei do mandado de segurança para determinar que nos casos em que estiver em discussão atos ou decisões do presidente da República, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF), a competência para decidir sobre a concessão ou denegação de medida liminar pertencerá ao plenário do Supremo, suprimindo-se, portanto, a possibilidade hoje existente de concessão individual da medida urgente. A proposta tem uma finalidade básica: aperfeiçoar os instrumentos jurídicos de exercício da cidadania de forma a conformá-los ao princípio fundamental da independência e harmonia entre os Poderes constituídos.


Quando a decisão é da instituição, e não do homem, questionamentos -dos legítimos aos mais absurdos- se esvaem


O fato é que ninguém em sã consciência pode negar o papel fundamental exercido pelo STF no Estado democrático de Direito que se vive no Brasil hoje. Ocorre que o intenso exercício da cidadania revela falhas no sistema jurídico que antes eram imperceptíveis. Com efeito, quando se atribuem novas funções da mais alta relevância aos titulares dos três Poderes da República, até que se encontre o perfeito equilíbrio entre o exercício da atividade estatal e os limites que lhe são impostos pelos direitos fundamentais, é natural que tensões haja, e que, na defesa de seus direitos fundamentais, os cidadãos acabem por recorrer à última trincheira de que dispõem -o Poder Judiciário- para anular a decisão ou o ato que reputam ofensivo a sua esfera jurídica.
É nesse contexto que o mandado de segurança ocupa papel central na tutela dos direitos que asseguram a cidadania, e é também nesse contexto que, por mandamento constitucional, compete ao STF julgar originariamente os mandados de segurança contra atos dos titulares dos três Poderes da República. Importante salientar que o comando constitucional não atribui a um único ministro a competência para decidir o mandado de segurança. Ela atribui, sim, ao tribunal, assim entendido o conjunto de ministros que integra o plenário daquela corte de Justiça.
Na prática, porém, a legislação infraconstitucional e o regimento interno definem que caberá individualmente a um único ministro -chamado de relator- a decisão sobre a concessão ou denegação de liminares em ações dessa natureza. Aliás, é assim em qualquer ação da competência originária dos tribunais, país afora. Naturalmente, quando se trata de questões sem grande repercussão direta nos fundamentos da República, os efeitos de decisão desse jaez -corretas ou incorretas, não discutimos o mérito- não causam a mesma comoção popular que aquelas tomadas pelo Supremo -ainda que corretas. Isso porque a Constituição apenas atribui originariamente a esse tribunal a competência para julgar causas cuja importância e sensibilidade foram assumidas como pressuposto.
Daí porque entendemos que não pode ser saudável para as instituições democráticas que, por exemplo, um ministro isoladamente, sem consultar seus colegas, e, algumas vezes, contrariamente ao pensamento majoritário do tribunal, conceda liminar contra decisão de outro ministro do próprio STF. O mesmo se aplica a decisões do presidente da República e do Congresso Nacional. O constituinte sabiamente alocou no tribunal mais elevado da nação aqueles 11 juristas que são considerados os melhores de sua época. E quando previu o STF como um colegiado, e não como um agrupamento de juízes com competências individuais, certamente desejava que houvesse o saudável confronto plural de idéias que ocorre no debate travado no órgão colegiado e a fiscalização recíproca entre seus membros.
Se não é falsa a afirmação de que o STF é composto dos mais brilhantes e capazes juristas brasileiros, não é menos falsa a de que 11 cabeças, trabalhando juntas, pensam infinitamente melhor que apenas uma! Na jovem democracia brasileira, não podemos nos dar ao luxo de permitir que ilações infundadas ponham em questão a hombridade e o caráter de nossos mais elevados juízes, como se fez, injustamente, é bom que se diga, não raras vezes em nossa história recente. Quando a decisão é da instituição, e não do homem, todos os questionamentos -desde os mais legítimos até os mais absurdos- se esvaem. Trata-se não mais da decisão de um juiz, mas do mais alto tribunal da República.
E é nesse sentido que nosso projeto pretende, a um só tempo, por um lado resgatar a vontade do legislador constituinte quando outorgou competência ao ente coletivo, e não aos indivíduos que o compõem, e, por outro, reforçar o prestígio e a confiança que o STF sempre gozou e ainda goza em nossa democracia. Em razão disso acreditamos que os opositores desse projeto, na verdade, não compreenderam a sua essência. Não podemos crer que exista no Brasil algum homem público que seja contrário à idéia que tivemos ao propor tão significativa alteração em nosso sistema legal.
A bem do fortalecimento do STF, seria fundamental que o Senado e a Câmara aprovassem, o mais rápido possível, nossa proposta. Assim, acreditamos, inauguraremos uma nova fase da defesa judicial dos direitos inerentes à cidadania, com o correspondente incremento do prestígio das nossas instituições democráticas.

José Jorge é senador da República pelo PFL de Pernambuco.


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