São Paulo, terça-feira, 04 de junho de 2002

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ROBERTO MANGABEIRA UNGER

A sucessão em São Paulo

Qualquer paulista que saia pela rua perguntando o que pensam os eleitores dos pré-candidatos a governador de São Paulo encontrará como tônica das respostas a frustração. Como pode nosso maior Estado, o centro da economia brasileira, uma das grandes regiões produtivas do mundo, o lugar a que toda a nação acorreu em busca de oportunidades, agora ameaçado na posse daquilo que sempre lhe foi essencial -condições para trabalhar- ter de escolher seu governador entre nulidades malogradas e aproveitadores desacreditados? Bloqueado no exercício do dinamismo que lhe define a natureza e culpado pelo Brasil por um modelo econômico do qual tem sido a maior vítima, São Paulo é hoje mais do que nunca o fulcro do problema brasileiro. Precisa de rumo e de agente.
O governo de São Paulo não pode reorientar a economia brasileira. Pode, contudo, conseguir muito com pouco, graças ao efeito combinado de iniciativas em três áreas cruciais: emprego, ensino e segurança. São Paulo, que sempre acreditou na suficiência da ação privada, precisa hoje de ação pública para escapar do imobilismo a que se deixou condenar.
A política de emprego tem de incluir três elementos. O primeiro, intervenção direta e pontual: obras públicas, sobretudo na construção de habitações populares, à base da regularização da posse da terra nos loteamentos irregulares e da parceria com as comunidades, para gerar empregos em regime de emergência. O segundo, incentivo sistêmico: benefício fiscal para as empresas, grandes ou pequenas, que se comprometerem a contratar empregados menos qualificados e a trabalhar com o governo para qualificá-los. O terceiro, parceria capacitadora: associação com o Sebrae e com outras entidades para dar à multidão de empreendedores emergentes, que constituem a principal riqueza da economia paulista, meios para ganhar acesso ao crédito, ao conhecimento, à tecnologia, aos mercados e, pela cooperação entre os produtores, à escala. Se não pode mudar a macroeconomia do país, um governo estadual pode ajudar a reverter expectativas na microeconomia da produção.
A política de ensino deve concentrar-se em objetivo central e viável, da alçada do governo do Estado: a generalização da escola média e a multiplicação de escolas médias públicas que sejam melhores do que as escolas particulares. Retreinar os professores para um ensino capacitador. E ir ao encontro dos alunos mais aplicados ou talentosos, oferecendo-lhes bolsas de sustento integral tanto no ciclo secundário quanto no superior. O resultado, no acalentamento de ambições, seria imediato.
A política de segurança precisa avançar em linhas paralelas: na criação de uma polícia inteligente, apoiada em tecnologia e conhecimento, e na aliança dessa polícia com as comunidades, organizadas e equipadas para vigiar. O crime organizado é desbaratado pela força instruída; o crime desorganizado, pela vigilância associativa.
São Paulo está cheio de homens e de mulheres capazes de liderar processo norteado por essas diretrizes. Só que ou não são políticos ou não são conhecidos. Como tornar alguns desses desconhecidos conhecidos, transformar alguns desses não-políticos em políticos e livrar São Paulo de escolher entre os que nada fazem e os que fazem qualquer coisa? Usando o jogo partidário e político para desafiar as regras desse jogo. Alcançando o difícil por meio do surpreendente.
Criando, quando menos esperado, a alternativa que falta.


Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.

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