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TENDÊNCIAS/DEBATES
Ser oposição
DENIS LERRER ROSENFIELD
Não é fácil ser oposição no Brasil!
Os rumos do governo Lula, assumindo a ortodoxia nas políticas fiscal e
monetária e rompendo com a sua fraseologia revolucionária, colocaram a
oposição na difícil tarefa de repensar a
sua atuação. Vimos, nestes primeiros
meses, uma oposição que caminha trôpega, alguns logo caindo no fisiologismo, outros seguindo o seu caminho
cambaleantemente, sem saber o que fazer. Chegou-se inclusive à inusitada situação de, quando se fala de oposição,
mencionar-se a luta dos "moderados"
petistas contra os "radicais", como se a
oposição fosse PT x PT!
Há uma tendência entre os partidos
de considerar os seus interesses como
superiores aos do Estado. Frequentemente, as lutas pelo poder tomam a forma de um vale-tudo, sem que se faça
uma pergunta básica: é a proposta boa
ou não para o Brasil? Quando na oposição, o PT não hesitou em contrapor-se a
medidas governamentais, contanto que
aumentasse o seu capital político. O
exemplo mais eloquente é o da reforma
da Previdência, combatida pelos que
hoje propugnam por sua aprovação. O
próprio presidente se referiu a essas atitudes como "bravatas", tornando patente um comportamento irresponsável, porém eleitoralmente compensador. Ocorre, contudo, que os partidos
de oposição não podem mais fazer uso
desse mesmo instrumento, pois o PT tinha, outrora, uma credibilidade, a da
"mudança", que o tornava confiável.
Ademais, o governo petista se apropriou da agenda tucana, colocando-se
como uma continuação da era FHC. As
reformas propostas pelo governo anterior são, agora, tidas por prioritárias.
Logo, fica difícil para os tucanos e para o
PFL oporem-se ao que era a sua agenda.
Os outros partidos, por sua vez, foram
habilmente cooptados pelo governo, na
melhor tradição cartorialista brasileira.
O que sobra, então, para a oposição?
Deve-se desconsiderar uma mera
oposição pela oposição, pois essa política será ineficaz, exibindo um interesse
partidário menor em relação ao interesse nacional. Assinalar as incoerências
entre a prática governamental e as posições históricas do PT pode render frutos, sempre e quando não se esgotem
apenas nisso, pois o próprio PT, pelos
radicais, ocupa esse espaço. Verdadeiras alternativas, eis o nó da questão.
A área de segurança é uma das mais
sensíveis do país, pois mostra a falência
do Estado em assegurar uma de suas
funções básicas, a paz pública. O governo anterior não tem nenhuma lição a
dar, pois o atual está colhendo apenas os
frutos do descalabro passado. Insistir
abstratamente nos direitos humanos
não produz tampouco nenhum efeito,
se essa política for somente identificada
aos direitos dos criminosos e presidiários. E as vítimas, não têm direitos?
Na área tributária, o PT está propondo uma reforma que, no conjunto, vai
onerar o contribuinte, apesar da eliminação de alguns efeitos em cascata
-mas não o maior deles, o da CPMF.
Seguindo a linha do governo anterior,
não haverá uma diminuição da carga
tributária. Abre-se um amplo espaço
para um partido que defenda os cidadãos contra a voracidade fiscal do Estado. O PFL tem se movido nessa direção.
Deve-se desconsiderar uma mera oposição pela oposição, pois essa política será
ineficaz
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Na área social, o governo ainda não
disse ao que veio, pois o Fome Zero tem
tido somente um efeito publicitário,
sendo um programa inferior aos adotados pelo governo FHC, dado o seu caráter assistencialista. Além disso, o choque dos ministros da área, rivalizando
em incompetência, abre um espaço a
ser ocupado por propostas concretas de
resolução dos graves problemas sociais
do país. No entanto parece que os partidos de oposição não têm em seu histórico uma verdadeira preocupação social.
A "direita" deve roubar a bandeira de
uma "esquerda" que não sabe o que fazer com suas posições passadas!
Na área educacional, o governo anterior estabeleceu uma cultura de avaliação, concretizada pelo Inep e pela Capes, que parece conflituar com o que está sendo proposto. Políticas de apoio ao
ensino básico foram implementadas e
houve uma valorização dos professores
universitários, via aumentos salariais,
apesar de não ter havido progresso na
questão estrutural das universidades
públicas. Trata-se de um terreno muito
movediço, pois propenso à ideologização e à demagogia. A discussão dessas
questões é importante do ponto de vista
de um projeto para o Brasil.
Na área econômica, a atual política
monetária produzirá um menor crescimento do país e um aumento do desemprego. Logo, descortina-se aqui um espaço propício à inflexão da política
atual com propostas concretas, que
mostrem a compatibilidade entre a responsabilidade fiscal e o desenvolvimento. A corrente "desenvolvimentista" do
PSDB tem um lugar a ocupar, da mesma maneira que os liberais podem propugnar por uma maior desregulamentação do Estado.
Por fim, o governo mantém uma política de defesa do MST, fazendo vista
grossa à aplicação da MP que criminaliza as invasões de terras e não as coibindo. As desapropriações de terras, no Rio
Grande do Sul, inscrevem-se numa
mesma linha de apoio ao MST, fortalecendo as alas radicais do partido. Ora, o
MST é o PT (revolucionário) do PT (social-democrata). Se os conflitos se agudizarem no campo, com o império da
demagogia, abre-se às oposições uma
esfera de atuação na defesa da democracia e do Estado de Direito.
Denis Lerrer Rosenfield, 52, doutor pela Universidade de Paris 1, é professor titular de filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul
e editor da revista "Filosofia Política".
denisrosenfield@terra.com.br
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