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Dimensão paralela
O presidente Lula e o PT estão se especializando em criar um mundo onde ficções úteis sobrevivem divorciadas da realidade
O PARTIDO dos Trabalhadores e seu presidente
de honra, Luiz Inácio
Lula da Silva, parecem
viver numa dimensão paralela,
onde entidades oníricas têm o
dom de intervir sobre a realidade
e não vigora o princípio da não-contradição. Pelo menos é isso o
que se depreende das teses apresentadas no 3º Congresso do PT,
que teve lugar neste fim de semana em São Paulo.
No fantástico mundo de Lula,
petistas não devem ter vergonha
de defender "companheiros" que
se tornaram réus no processo do
mensalão, e o eterno presidente
de honra pode candidamente
proclamar: "Ninguém neste país
tem mais autoridade moral e ética do que nosso partido".
Na Terra do Nunca presidencial, em que a boa e velha lógica
aristotélica foi substituída pelas
evasivas e tergiversações delubianas, tais afirmações podem
coexistir pacificamente com as
11,2 mil páginas do inquérito
(descontados anexos e tabelas)
em que se descreve com alguma
minúcia o esquema de banditismo urdido por baluartes petistas
para desviar dinheiro público e
corromper parlamentares. Pouco importa que o próprio Lula já
se tenha dito "traído" pelos companheiros que agora absolve.
No mundo quântico petista, é
possível que algo esteja vivo e
morto simultaneamente. O partido, extravasando ecos de um
passado que não existe mais, se
compromete a lutar pelo "socialismo democrático e sustentável" -o que quer que isso signifique. Mais do que isso, propõe um
plebiscito pedindo que se anule a
privatização da mineradora Vale
do Rio Doce, realizada pelo governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). Nem parece
tratar-se da mesma legenda que
dá sustentação ao governo que
paga a segunda maior taxa de juros do planeta e cujo líder máximo afirmou há pouco que os ricos já ganharam muito em sua
administração e não têm motivos para queixas.
Na Utopia petista, o partido
aprova resolução em que defende o direito ao aborto, convencionais vaiam uma ex-parlamentar que discursa contra o procedimento, e o governo indica um
católico ultraconservador para
compor o Supremo, que acabará
julgando a matéria.
Na mesma linha, a legenda
aprova uma moção com críticas
aos militares e em que exige a
abertura dos arquivos da ditadura. Nem parece tratar-se do mesmo PT que, no governo, cedendo
aos apelos do Exército e do Itamaraty, manteve a absurda figura jurídica dos documentos oficiais sob sigilo eterno.
Diga-se em favor do PT e do
presidente Lula que eles ao menos conseguiram reinventar a
dialética marxista, ao engendrar
um governo que já traz em si
mesmo sua própria negação. É
lamentável que tal inovação só
subsista com o sacrifício da realidade. É nisso que Lula e o PT estão se especializando.
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