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A ESCOLHA DE BUSH
Os norte-americanos concederam a George W. Bush o
direito de permanecer por mais quatro anos no cargo eletivo mais poderoso do planeta. Num pleito extremamente disputado, o candidato republicano derrotou seu desafiante
democrata, o senador John F. Kerry.
O sistema de escolha do presidente
nos EUA, em que o mandatário não é
apontado diretamente pela população, mas por meio de um colégio
eleitoral, esteve perto de gerar mais
uma crise como a de 2000. Desta vez,
contudo, a diferença em favor de
Bush no Estado que se revelou mais
problemático, o de Ohio, foi suficiente -cerca de 130 mil votos- para evitar a indefinição e as conseqüentes batalhas judiciais.
No voto popular, o presidente reeleito venceu seu oponente com mais
de 3,5 milhões de sufrágios de vantagem, recebendo um claro mandato
para seguir com a política externa
unilateralista e empunhar as bandeiras neoconservadoras que marcaram
sua primeira administração. Já não
resta dúvida de que, após os atentados do 11 de Setembro, o eleitorado
norte-americano se inclinou mais
para a direita, embora a sociedade
continue dividida ao meio. Os republicanos também ampliaram sua
maioria na Câmara e no Senado.
A América que triunfou foi aquela
representada pelos Estados do Sul,
da região das Rochosas e de parte do
Meio-Oeste -a América interiorana
da "apple pie" e dos rifles pendurados nas camionetes. Ficaram com
Kerry a Costa Oeste, o Nordeste e
parte do Meio-Oeste -a América
cosmopolita das universidades e dos
centros urbanos sofisticados, como
Nova York, Chicago e Los Angeles.
No início do primeiro mandato,
chegou-se a imaginar que Bush, desgastado pela crise eleitoral de 2000,
faria um governo de conciliação, visando ao centro político. Todavia,
com a reação nacional ao 11 de Setembro, ele obteve a legitimidade que
não conquistara na votação para implementar políticas mais agressivas.
Agora, com o apoio popular arrebatado nas urnas, deverá sentir-se
autorizado a enfatizar suas posições
radicais na chamada guerra contra o
terrorismo. Da mesma forma, é provável que se considere fortalecido em
sua cruzada religiosa contra a pesquisa com células-tronco, o casamento homossexual e o aborto.
Para o mundo, cujas complexidades são traduzidas pelo presidente
reeleito como uma guerra entre o
bem e o mal, a perspectiva, a confirmarem-se esses prognósticos, é
sombria. Serão mais quatro anos de
política imperial, ditada pela doutrina que defende ataques preventivos e
não hesita em passar por cima das
instituições multilaterais.
Um outro cenário, menos provável,
porém mais auspicioso para o equilíbrio mundial, seria o presidente
Bush -considerando a divisão da
sociedade norte-americana, as resistências de importantes países aliados
e as dificuldades enfrentadas no Iraque- buscar mais legitimidade internacional para encaminhar sua política externa. A previsível tentativa de
preparar terreno para a estabilização
do Iraque poderá encontrar maior
boa vontade dos governos europeus,
que, pragmaticamente, terão que
conviver mais quatro anos com o líder republicano.
Do ponto de vista econômico, a
reeleição poderá também agravar os
problemas da primeira gestão, quando Bush cortou impostos dos mais
ricos e aumentou os gastos públicos,
convertendo um superávit fiscal de
quase 3% do PIB num déficit público
preocupante. Pressões para pôr fim à
irresponsabilidade fiscal continuarão partindo dos democratas e deverão encontrar mais eco entre os próprios republicanos. Resta saber,
mais uma vez, que linha Bush se sentirá estimulado a seguir: a que traduz
seus instintos políticos ou a que se
afigura mais racional.
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