São Paulo, sábado, 04 de novembro de 2006

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FREDERICO VASCONCELOS

Peneiras e tapetes

OS ANALISTAS políticos poderão conferir nos próximos quatro anos se José Serra e Aécio Neves, que acalentam disputar a faixa presidencial em 2010, conseguirão desativar, em seus governos, algumas minas tucanas que foram relegadas durante esta campanha eleitoral.
Do lado mineiro, coube ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em carta ao PSDB, admitir que o partido tentou "tapar o sol com a peneira" no caso do senador Eduardo Azeredo. A referência remete ao esquema de financiamento eleitoral de tucanos e aliados em 1998, aproximando o episódio às origens do mensalão.
Especula-se em Minas Gerais que o recém-eleito senador Eliseu Resende (PFL) pode vir a ocupar uma secretaria no governo estadual, abrindo espaço para que o suplente, Clésio Andrade, vice-governador de Aécio, assuma o Senado. Clésio foi sócio de Marcos Valério e é alvo de investigação sigilosa na Justiça Federal por suspeita de lavagem de dinheiro em operações no Banco Rural -em dose menor, mas semelhantes às do valerioduto. O Coaf chegou a citar "operações não usuais" entre a agência SMPB, Clésio e Azeredo.
Do governo mineiro, Clésio Andrade já conseguiu a recente indicação de sua mulher para o cargo vitalício de conselheira do Tribunal de Contas do Estado. Do lado paulista, um Lula acuado na campanha foi incapaz de cobrar de Geraldo Alckmin a "operação-abafa" sobre a Nossa Caixa: as suspeitas de um "mensalinho" para favorecer deputados da base aliada com publicidade do banco. A demora na investigação do Ministério Público Estadual evitou embaraços ao candidato Alckmin -ou o privou de um atestado de não-envolvimento nas graves irregularidades da Nossa Caixa.
"Ajustes verbais" permitiram às agências Colucci e Full Jazz gastar R$ 45,4 milhões sem contrato. Em oito meses, na reeleição de Alckmin, foram consumidos R$ 28 milhões, verba publicitária do banco prevista para durar 18 meses.
Depoimentos e documentos apontam o uso político da publicidade de outras estatais, sob orientação do Palácio dos Bandeirantes. A Sabesp só prestou informações ao promotor do caso quando seu superintendente se viu ameaçado de processo por desobediência. A CDHU mentiu ao negar ter anunciado na revista de um deputado que cobrava preços superiores aos praticados pelo mercado.
"Governar é escolher", repetiu Alckmin na campanha em que acusou a gestão petista de esconder irregularidades debaixo do tapete.
Até 2010, o eleitor saberá se Aécio e Serra abandonarão a peneira, estimulando o amplo esclarecimento dos fatos, ou se preferirão mantê-los sob o tapete.


FREDERICO VASCONCELOS é repórter especial da Folha.

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