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HÉLIO SCHWARTSMAN
O plebiscito da maconha
SÃO PAULO - Ainda não foi desta
vez que os californianos liberaram
a maconha. Mas, a julgar pelo resultado deste primeiro plebiscito,
no qual a legalização da erva para
fins recreativos obteve a adesão de
impressionantes 46% dos eleitores,
isso acabará ocorrendo em algum
momento nos próximos anos.
Desconfio um pouco dessas iniciativas em favor da maconha. Não,
ainda não me tornei um membro do
Tea Party, um conservador empedernido, daqueles que gostam de
fritar estupradores na cadeira elétrica e acham que lugar de viciado é
a prisão. Meu problema com esse
gênero de proposta é que, ao limitar
a discussão à maconha, deixando
de lado as outras drogas ilícitas,
não promovemos uma abordagem
mais racional do problema.
Convenhamos que o "statu quo"
não muda muito se liberamos a maconha, mas mantemos a cocaína e
as drogas sintéticas proibidas. As
supostas vítimas do delito seguiriam fazendo fila à porta do traficante para entupi-lo de dinheiro
com o qual corrompe autoridades e
financia outras atividades ilegais.
A grande verdade é que a linha
proibicionista, que vigora há cem
anos, fracassou. Gastamos centenas de bilhões de dólares por ano
para manter o consumo mais ou
menos estável ao longo da última
década -em torno de 5% da população com mais de 15 anos, segundo a ONU. É provável, como querem os proibicionistas, que, sem a
repressão, a prevalência fosse
maior, mas ninguém sabe ao certo
se esse efeito é real nem em que
grau ocorreria, pois nenhum país
testou ainda a legalização.
O que me faz pender definitivamente para a liberação, mais do
que considerações epidemiológicas, é a convicção filosófica de que
existem limites para a interferência
do Estado na vida do cidadão. Eu
pelo menos nunca firmaria um contrato social no qual abriria mão de
decidir o que posso ou não ingerir.
Esse é um direito que, creio, vem no
mesmo pacote do da liberdade de ir
e vir e de dizer o que pensa.
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