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ANTONIO DELFIM NETTO
O que depende de nós
O primeiro passo para o sucesso
de um política econômica é fazer
um diagnóstico realista da situação.
Durante o processo eleitoral, pode-se
atribuir ao passado todos os problemas (quem, afinal, poderia tê-los criado, senão o que se vai?), cometendo,
frequentemente, a injustiça de ignorar
as condições objetivas do mundo em
que o país está inserido. Uma vez começada a sucessão, o novo poder incumbente tem de enfrentar a realidade como ela se apresenta. Culpar o
passado pelos seus erros ou tentar
mudar a realidade elevando quixotescamente a voz, como se o Brasil fosse
tão importante que o mundo não pudesse viver sem ele, pode até dar algum conforto. Este logo se esgotará, e
a fria e feia realidade se imporá com o
famoso "decifra-me ou devoro-te!".
Em termos simples, nossa situação é
a seguinte: chegamos a setembro de
2002 com enormes dificuldades de liquidez externa e tivemos de voltar pela terceira vez ao FMI para obter um
novo empréstimo de US$ 30 bilhões.
Esse empréstimo permitirá que o governo atual termine sem que a crise
agrave e dará ao novo governo, se
cumprir o acordo com aquela instituição, condições de manobrar em 2003.
Em poucas palavras, o mundo cansou
de financiar nosso consumo, representado pelos US$ 190 bilhões de déficits em conta corrente feitos pelo governo FHC entre 1995 e 2002. Por isso
(como acontece com qualquer empresa que exagera nas dívidas) o mercado
financeiro cortou o financiamento do
"capital de giro" para tocar o Brasil
S.A.
A solução não é agredir o credor,
que está mais cuidadoso porque a
conjuntura mudou nem reclamar de
que o mundo nos persegue. Objetivamente, um mercado financeiro que
1º) sofre de uma aversão ao risco por
parte dos investidores; 2º) tem de obedecer a uma legislação prudencial cada vez mais rigorosa e 3º) tem os seus
"ratings" rebaixados quando aumenta sua exposição no Brasil tinha mesmo de tomar uma atitude defensiva
com relação a nós. Não adianta ficar
triste ou pensar que vamos alterar isso
apenas reafirmando um duvidoso discurso de que "somos os excluídos" da
economia mundial. É preciso alterar
as condições objetivas que deram ao
mercado financeiro a percepção que
tem do Brasil. É disso que se trata: cabe a nós mudá-la e estimulá-los a perceber a mudança pela estabilização da
relação dívida líquida/PIB e pela redução das relações dívida externa/exportações e dispêndio com amortização
mais juros/exportação.
Isso exige uma política econômica
que apresente resultados a curto prazo
e prepare o país para o crescimento
econômico a longo prazo, enfrentando os problemas estruturais. A relação
dívida líquida/PIB se estabiliza pela
geração do superávit primário adequado, e as outras duas, pela elevação
do valor das exportações. A primeira,
felizmente, está nas mãos do governo.
As outras correm por conta do efeito
do câmbio real (que já aumentou a
quantidade exportada) e de algum aumento dos preços internacionais, que
virão quando a conjuntura mundial
melhorar.
Os credores entendem e têm paciência com o esforço exportador. O que
eles esperam é o comportamento adequado com relação ao superávit primário, que depende apenas de nós.
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras
nesta coluna.
E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br
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