São Paulo, domingo, 05 de fevereiro de 2006

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CLÓVIS ROSSI

O supremo trambique

SÃO PAULO - No Peru, como em alguns países latino-americanos, os congressistas, ao assumirem o cargo, juram "por Dios y por la pátria". Pois bem: Rafael Roncagliolo, conceituado analista peruano, conta que, recentemente, um deles se equivocou e jurou "por Dios y por la plata".
Surpreende-me que o caso tenha ocorrido no Peru, e não no Brasil.
É um ato falho revelador da mentalidade trambiqueira que domina boa parte do mundo político latino-americano, do Brasil inclusive -ou principalmente.
Já deixou de surpreender, no entanto, a tremenda complacência do público para com os trambiques dos políticos. Gozam de privilégios obscenos e, quando sob tíbia pressão, reduzem algum deles, sentem-se e comportam-se como heróis imaculados.
Em qualquer país minimamente sério, se tivesse havido compra de votos para aprovar alguma coisa, como aconteceu no caso do instituto da reeleição, a votação seria anulada. No Brasil, não. Continuou valendo, e o partido então no poder não teve o menor escrúpulo em beneficiar-se do resultado de uma votação provadamente viciada.
Muda o governo, mas o vício continua. A compra de deputados volta a ser provadamente praticada, mas ninguém nem sequer cogita de anular as votações de que participaram os trambiqueiros do "mensalão".
Agora, prepara-se o supremo trambique, na forma da possível candidatura do presidente do STF, Nelson Jobim. Em qualquer país minimamente sério, juiz é juiz, não pode ser parte. Se o for, todas as decisões que tomou estarão maculadas pela suspeita. Aqui, não.
Faz-se ensurdecedor silêncio nos partidos, em especial naqueles que podem beneficiar-se de alguma forma da candidatura Jobim.
É típico de um mundo, o político, em que os atores giram em torno de seus próprios interesses e apetites, em geral pouco sadios. Quem falar, entre eles, em bem comum ou interesse público merece escárnio.


@ - crossi@uol.com.br

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