São Paulo, domingo, 05 de março de 2000 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES O livro do traficante
O tráfico corrompeu a polícia e o restante da sociedade brasileira de tal forma que já não conseguimos enxergar os limites de sua ação. Vão parar na cadeia só os traficantes menores encarregados do comércio de rua, imediatamente substituídos por novos recrutas. Seus empregadores, jamais. Em 11 anos de trabalho na Casa de Detenção do Carandiru, em São Paulo, nunca vi um grande traficante atrás das grades. Na outra vertente, a dos doleiros, donos de financeiras e bancos de investimento, que lavam o dinheiro do tráfico, o risco de ser preso é zero no Brasil. Ao contrário, como cabe a eles a parte do leão nos lucros do negócio, obtida sem nenhum envolvimento com a arraia-miúda que arrisca a vida nos pontos-de-venda, podem frequentar as colunas sociais impunemente. Voltemos, então, ao caso do agora procuradíssimo Marcinho VP, do cineasta João Salles, do governador do Rio e da CPI. Com o adiantamento para que o traficante escrevesse o livro, o cineasta se expôs à execração pública, catalisada pela esperteza de políticos que, na falta de um programa de combate às drogas digno desse nome, saem atrás de publicidade barata, que casos como esse podem render. O cineasta pagou caro pela ousadia de sua atitude e ainda vai passar pelo constrangimento de depor diante da CPI, com a finalidade de esclarecer sua contribuição de R$ 4.800 ao narcotráfico brasileiro. O traficante, que fugiu em outubro de 1996 pela porta da frente da Polinter (Polícia Interestadual), no Rio, provavelmente será preso agora. Curiosamente no momento em que perdeu o poder no morro e decidiu escrever um livro de memórias. Drauzio Varella, 56, médico oncologista, é autor do livro "Estação Carandiru" (Cia. das Letras). Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Barry McCaffrey: União na política antidrogas Próximo Texto: Painel do Leitor Índice |
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