São Paulo, quarta-feira, 05 de maio de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Ações afirmativas: as razões da UnB
TIMOTHY MARTIN MULHOLLAND
O vestibular da UnB é um dos mais concorridos do país, com mais de 30 mil candidatos para menos de 2.000 vagas por semestre. Em alguns cursos, a concorrência ultrapassa 60 candidatos por vaga. Esse nível absurdo de competição é resultado do abandono das universidades públicas pelo governo federal, a partir do início dos anos 90. Por isso, 90% dos nossos jovens não têm acesso ao ensino superior. Só 3% estudam em universidades públicas, que oferecem ensino gratuito e de reconhecida qualidade. Não é falta de competência dos candidatos, é falta de vagas. Após três anos de debates, a UnB definiu sua política de ações afirmativas, que inclui o sistema de cotas para negros, escolhido por ser o mecanismo com o qual a universidade pode produzir resultados concretos quanto ao acesso de jovens negros qualificados em número maior e mudar o perfil do corpo discente, no médio prazo, para que ele se aproxime da composição racial da população. Desde a implementação do Programa de Avaliação Seriada e dos cursos noturnos, nos anos 90, a UnB já tem aumentado significativamente o ingresso de alunos de baixa renda e oriundos de escolas públicas. O fortalecimento do apoio da UnB ao ensino público no Distrito Federal é outro mecanismo de inclusão social que também mostrou resultados. Essas medidas, porém, não alteraram significativamente a composição racial do nosso corpo discente. O Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão, responsável pelas normas de admissão da UnB, aprovou em de junho de 2003 o Plano de Metas para Integração Étnica, Racial e Social, enfocando a inclusão de alunos negros e indígenas, bem como a intensificação do apoio às escolas públicas. Decisão refletida, consciente e madura, digna da história da UnB. A análise das experiências das universidades do Rio de Janeiro, Bahia e Mato Grosso, bem como as simulações realizadas com os dados do nosso último vestibular, permitiram-nos estabelecer diretrizes para o procedimento a ser seguido. Nosso público-alvo é o candidato negro -aquele brasileiro que, devido a sua aparência física, seu fenótipo, é discriminado sistematicamente na sociedade. Nosso processo não será invalidado ou desmoralizado pelos candidatos que, eventualmente, se inscreveram sem atender aos critérios estabelecidos no edital. A autodeclaração, por si só, demonstrou-se frágil como instrumento único de inscrição. A discriminação se dá socialmente, por isso a implementação de ações afirmativas terá de se dar da mesma maneira. Nossos estudos também nos permitem previsões seguras sobre o processo: o estudante selecionado pelo sistema de cotas trará condições de desempenho pleno como universitário. Os alunos desse sistema serão recebidos no campus, como é próprio do meio acadêmico. Receberemos mais alunos de baixa renda, o que exigirá apoio em termos de bolsas e suporte social para garantir sua permanência. Fiel à sua missão pública, a UnB se une às demais instituições comprometidas com a redução das profundas desigualdades no Brasil e, assim, participa da construção de um caminho de efetiva inclusão social. Timothy Martin Mulholland, 54, doutor em psicologia pela Universidade de Pittsburgh (EUA), é vice-reitor da Universidade de Brasília. Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Bismarck Maia: Sabor de 1º de abril Índice |
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