São Paulo, terça-feira, 05 de julho de 2011

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A doença do caudilho

Um exame da situação venezuelana, na esteira da revelação sobre a doença de Hugo Chávez, evidencia o efeito deletério dos 12 anos de domínio do autocrata.
No campo governista, o caudilho impediu a ascensão de eventuais sucessores e afastou, um a um, aliados que pudessem ofuscar sua figura. Um caso exemplar é o de Isaías Baduel, ministro da Defesa que o salvou do golpe em 2002 e rompeu com Chávez em 2007, por ser contra reeleições sucessivas do chefe. Está preso.
A evolução das informações sobre a moléstia revela o grau de personalismo a que chegou o regime. Durante quase um mês, aliados próximos negaram que Chávez tivesse câncer. Acabaram desmentidos pelo líder, na TV.
O presidente parece ser o único capaz de aglutinar as forças que sustentam seu governo. Se sair de cena, em caso de agravamento da doença, abriria um vácuo cujas consequências são incertas.
A oposição, unida antes de tudo pelo antichavismo, ainda precisa encontrar um nome forte de consenso para a eleição do ano que vem. A perspectiva real de chegar ao poder, com a doença de Chávez, pode favorecer a coesão.
Esse cenário de incerteza política se agrava um tanto se visto à luz da situação socioeconômica na Venezuela. O país enfrenta a maior onda de manifestações desde o início da década de 1980.
O aparelhamento da estatal de petróleo, PDVSA, levou a quedas na produção, principal fonte de recursos para sustentar o regime, prejudicado ainda pela baixa nos preços da commodity. A inépcia administrativa obriga a racionamento diário de energia. O PIB recuou 3,3% em 2009 e 1,4% em 2010. A inflação é de 30% ao ano.
A fragilidade institucional, engendrada pelo próprio Chávez como parte de seu projeto de perpetuação no poder, completa o quadro. A Constituição de 1999 dá ao presidente o poder de trocar seu próprio vice a qualquer momento -um "dedazo" para escolher o sucessor, em caso de ausência.
O retorno de Chávez a seu país, após quase um mês em Cuba para tratar de um misterioso tumor, faz pouco para diminuir as incertezas acerca do futuro político do país.
Não se conhece a extensão da doença e não se sabe a que tipo de tratamento Chávez será submetido, tampouco seus planos para a hipótese de não ter condições de governar. Criou-se uma situação em que a ausência do mandatário leva ao temor de piora do quadro crítico provocado por ele próprio.
A Venezuela celebra hoje 200 anos de independência, mas distante da liberdade e da democracia plena, com seu destino atrelado ao do combalido chavismo.


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