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OTAVIO FRIAS FILHO
Depois de um ano
Os ataques terroristas contra
Nova York e Washington, passado quase um ano, não revestiam, afinal, a importância histórica que todo
mundo chegou a vislumbrar então.
Permanecem, como evento singular,
assombroso, na condição de maior
atentado da história. Mas ninguém
pensa que assinalem uma mudança
de época, nem mesmo uma alteração
em seus rumos predominantes.
O esvaziamento das expectativas derivou da própria singularidade daquele atentado, ao qual não se seguiram
outros. Não houve, ao menos até agora, uma generalização do confronto
nem se pode dizer que o panorama
geopolítico tenha mudado, exceto pelo evidente agravamento da guerra
palestino-israelense e pela elevação do
atrito entre Índia e Paquistão.
Várias previsões em curso após o 11
de setembro se mostraram erradas.
Não houve sublevações em países islâmicos contra seus governos pró-ocidentais. A campanha no Afeganistão
não se revelou novo Vietnã. Os americanos conseguiram decepar o Estado
que fornecia logística à rede terrorista
e parecem tê-la desbaratado, mesmo
que temporariamente.
Não houve um surto de xenofobia
nos Estados Unidos, onde certo multiculturalismo já fincou raízes profundas demais para ser abalado. Houve o
esperado surto patriótico, que deu a
George Bush sua vitória "em segundo
turno" e vem legitimando uma diplomacia agressiva, obcecada por um só
tema e cada vez mais unilateral, conforme a memória dos atentados se vai.
Houve, no saldo de prós e contras,
aumento ou perda de poder por parte
dos Estados Unidos? A resposta talvez
seja um diplomático sim e não. Os ataques "inventaram" uma nova e terrível vulnerabilidade, cuja repetição
ninguém pode prevenir com certeza.
O preço psicológico cobrado por essa
ameaça diminui com a rotina diária,
mas não vai desaparecer tão cedo.
Por outro lado, os Estados Unidos
ampliaram o seu leque de alianças e
condescendências, colocam a Europa
em permanente dilema hamletiano,
obtiveram a capitulação final da Rússia e reduziram o raio de ação da China. É provável que tenham aumentado sua influência no mundo islâmico,
apesar das novas gerações de admiradores de Bin Laden.
Como sua agenda diplomática se reduziu quase a um só ponto, subordinaram toda a sua ação a esse objetivo,
fazendo aqui concessões de natureza
econômica em troca de apoio, aliando-se ali com antigos adversários. Ao
adotarem uma política amigável para
com o Paquistão, deram ensejo a mais
uma das ondas de conflito com a Índia, habituais entre esses dois maus vizinhos.
A piora na crise palestina parece ter
seguido uma dinâmica própria, especialmente irracional. O interesse norte-americano seria pressionar duramente Israel e forçá-lo de uma vez à
paz a fim de estancar um dos focos da
maré antiamericana. Interesse coincidente com o da maioria dos países
árabes, desmentido, porém, pelo terrorismo aberto, diário, que assola a região.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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