São Paulo, Domingo, 05 de Setembro de 1999
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O futuro da agricultura está no mercado



Tenha certeza: a questão não se resolve dando um gigantesco rebate sobre as dívidas
MARCUS PRATINI DE MORAES

Com o processo de globalização da economia e a crescente integração das nações em blocos econômicos, a sobrevivência de uma atividade como a agricultura torna imprescindível a busca da competitividade. Confiabilidade, sanidade e qualidade são precondições para conquistar novos mercados. Além disso, no anúncio do Plano Agrícola 1999/2000, o presidente da República determinou a adoção de providências para aperfeiçoar as condições de proteção de safra, por meio de operações nos mercados futuros. O que se está buscando é um mercado de maior liquidez, com maior número de participantes, inclusive permitindo aos investidores não-residentes no Brasil realizar aqui suas aplicações.
Ao autorizar os investidores externos a operar nos mercados futuros agrícolas brasileiros, o Conselho Monetário Nacional (CMN) acabou com o tratamento diferenciado que impedia investidores estrangeiros de operar em nosso país, visto que os brasileiros já estavam autorizados a operar nas Bolsas estrangeiras.
À exceção do café, o mercado de futuros agrícolas no Brasil é incipiente. O total de contratos negociados não atinge 1% da safra. Existem no Brasil contratos futuros para açúcar, algodão, café, milho, soja e boi gordo. Com a perspectiva de dinamização dos negócios, os produtores, as cooperativas, os comerciantes, as indústrias e os exportadores terão melhores condições para operar, dando liquidez ao mercado e maior segurança para a realização de contratos de médio prazo.
Um produtor que tem proteção de preços, por meio de operação em mercados de futuros, representa menor risco bancário. Desse modo, ele terá facilitada a obtenção de crédito junto de bancos, compradores ou fornecedores internos ou externos.
Para indústrias e exportadores, o hedge feito numa Bolsa estrangeira apresenta imperfeições que são minimizadas quando feito no mercado interno. As variáveis que interferem na formação dos preços externos, dependendo do produto, podem ser muito diferentes das variáveis internas.
O Brasil é um dos países com maior potencial de crescimento da produção agrícola do mundo. Somos a última fronteira agrícola do planeta. Todavia esse potencial só será aproveitado em sua plenitude se houver mercado e perspectivas de rentabilidade para o setor. Sob esse enfoque, o governo estuda, ainda, fórmulas para estimular a expansão do seguro agrícola privado, a Cédula de Produto Rural (CPR), com opção de liquidação financeira, e mudanças na lei de armazenagem.
Alavancar o aporte de capitais privados -internos e externos- para o financiamento da agricultura brasileira significa também aliviar o Estado do ônus que hoje lhe toca, criando bases mais sólidas para o setor iniciar o novo milênio em situação mais competitiva.
Nessas condições, o país terá na agricultura um seguro alicerce para atender às expectativas da sociedade, quanto à geração de mais renda e emprego. Porém não se faz agricultura sem renda. Para que o agricultor tenha renda, é preciso aumentar o preço e reduzir o custo de seu produto. Para obter um bom preço, é preciso conquistar mercado.
O que nos espera no front externo não é novidade: dumping praticado por norte-americanos e europeus, inviabilizando o acesso de produtos brasileiros a outros mercados. O que temos para contrapor a essas barreiras? Por meio de ações coordenadas, cuidar da produção, com tecnologia e produtividade, adequar a logística aos tempos atuais de uma economia que busca derrubar fronteiras e fortalecer toda a cadeia de produção, o que nos permitirá exportar nossos produtos com mais agressividade. É fundamental que façamos um esforço de marketing institucional, buscando vencer as dificuldades, as restrições tarifárias e não-tarifárias cada vez maiores contra nossas exportações e, em particular, contra nossos produtos agrícolas.
A agricultura é uma prioridade do governo brasileiro. O agronegócio é hoje responsável por quase 40% do Produto Interno Bruto, o que nos garante um amplo potencial de crescimento econômico e um espaço significativo para o aumento das exportações. O governo do presidente Fernando Henrique Cardoso tem a meta de elevar a colheita de grãos de 82,1 milhões de toneladas para 100 milhões de toneladas e de incrementar o comércio exterior brasileiro para chegar a 2002 com um resultado positivo de US$ 100 milhões.
Assim, o governo está procurando superar entraves que impedem o desenvolvimento do setor. Não enfrentamos um desafio, mas vários desafios. A agricultura brasileira vive um momento difícil: a renda caiu, inúmeros agricultores não têm condições de honrar os seus compromissos ou precisam de uma prorrogação de dívida. As principais causas dessas dificuldades podem ser encontradas nos baixíssimos preços internacionais dos produtos agrícolas, tendo em vista a retração na demanda e os pesados subsídios dos países desenvolvidos.
Tenha certeza de uma coisa: essa questão não se resolve dando um gigantesco rebate sobre as dívidas, o que se tornaria um grande privilégio e um grande benefício para um pequeno número de grandes devedores. Precisamos reconhecer que o problema existe e que a solução proposta pelo governo é equânime, visando beneficiar quem paga em dia e criando condições para que quem não está pagando possa voltar a pagar.
Marcus Vinícius Pratini de Moraes, 60, economista, é ministro da Agricultura e do Abastecimento. Foi ministro das Minas e Energia (governo Collor) e ministro da Indústria e do Comércio (governo Médici).



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