São Paulo, sexta-feira, 05 de novembro de 2004 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Fetiches ideológicos
CARLOS LESSA
O que me deixa mais apreensivo, porém, não são esses ataques, mas uma espécie de conspiração que se forma a partir de consultorias privadas e "acadêmicos-banqueiros", com a cooperação de alguns ex-presidentes do próprio BNDES, visando desmantelar o banco em seu reposicionamento como principal vetor do desenvolvimento nacional. Fala-se abertamente em retirar do BNDES os recursos do FAT e leiloá-los entre os bancos privados, a pretexto de "democratizar" o crédito e "reduzir" a taxa de juros ao tomador final. Fala-se que manter em nível baixo a taxa de juros de longo prazo obriga o Banco Central a aumentar a Selic. Fala-se que o crédito público relativamente barato força o aumento do custo do crédito nas faixas livres; logo, com juros devastadores, pune pessoas físicas e jurídicas. Tudo isso são fetiches ideológicos que escondem a intenção de desmontar o sistema de crédito público, destruindo a capacidade do governo de realizar política de financiamento, política industrial e política de desenvolvimento. Seria o coroamento do projeto neoliberal implementado no governo anterior -do qual teve de recuar quando chegou o momento de privatizar as grandes instituições financeiras (Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e BNDES), apesar do estudo Booz Allen, que custou milhões de dólares. Claramente, forças poderosas se movem agora para pressionar o governo Lula a fazer o que Fernando Henrique Cardoso deixou incompleto. Minha expectativa é que o sistema produtivo brasileiro e as forças políticas que o representam se dêem conta do ataque contra sua própria base de sobrevivência e expansão, que são os bancos públicos. Não há nisso nenhuma hostilidade ao sistema bancário privado. Entre os maiores banqueiros temos alguns comprometidos com o papel de financiar a produção e dar suporte ao crescimento econômico, numa profícua divisão de papéis com os bancos públicos. Nossas diferenças são com os ideólogos privatistas, que, a partir de modelos abstratos, querem destruir instrumentos públicos que funcionam com eficácia quando acionados para um programa de desenvolvimento de um governo eleito democraticamente. Como base de financiamento a longo prazo, o FAT é o principal instrumento financeiro do BNDES, que assim se tornou um dos maiores bancos de desenvolvimento do mundo. O desvio do governo anterior, que tentou reduzir o BNDES a um banco de investimento com critérios privados, foi revertido nesta administração, por decisão do presidente Lula, que tem dado todas as demonstrações de que vamos nos manter na trilha desenvolvimentista, para enfrentar a herança dos gigantescos problemas de renda e de emprego. Muita coisa se fez com descuido no governo anterior, inclusive algumas privatizações que acabaram ferindo o interesse nacional. A principal razão foi o domínio absoluto do pensamento único. Alguns ideólogos avançados do neoliberalismo faziam os primeiros movimentos e todos corriam para amplificá-lo. O que vemos agora, em relação ao BNDES e aos demais bancos públicos, são as primeiras manifestações de nova ofensiva desse estilo. Entretanto seus promotores estão muito enganados se pensam que vamos assistir calados a essa nova tentativa de pilhagem de recursos públicos no contexto de um governo popular que surgiu das massas, e não do conluio de elites. Carlos Lessa, 68, economista, professor titular do Instituto de Economia da UFRJ, é o presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Foi reitor da UFRJ em 2002. Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Boris Fausto: A vitória do santo guerreiro Índice |
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