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Ativismo judiciário
Dentro de sua atribuição, Supremo muda atitude e passa a intervir mais na sociedade e a suprir a omissão do Legislativo
NO ESPAÇO de poucas semanas, o Supremo
Tribunal Federal
(STF) ganhou manchetes ao tomar decisões polêmicas que implicaram a criação
de regras não-explícitas na legislação. A primeira foi o estabelecimento da fidelidade partidária.
Agora a corte impôs limites às
greves de servidores públicos.
Outras decisões do mesmo tipo
podem estar a caminho.
Esse novo ativismo judiciário
contrasta com a história da corte. Até recentemente, quando se
deparava com a ausência de norma jurídica, o STF limitava-se a
declarar a omissão do Legislativo, sem definir regras.
Embora grupos conservadores
torçam o nariz, essa não é uma
tarefa estranha ao Judiciário. Interpretar já é em alguma medida
reescrever a lei. No mais, a jurisprudência constitui em todos os
sistemas judiciais do Ocidente
fonte legítima de inovação.
No caso específico do ordenamento jurídico brasileiro, o inciso LXXI do artigo 5º da Constituição estabelece: "Conceder-se-á mandado de injunção sempre
que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício
dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania".
Tal mecanismo, importado do
direito anglo-saxão, que permite
a magistrados criar normas provisórias quando o Legislativo
deixa de fazê-lo, chegou a ser
apontado como uma das grandes
novidades da Carta de 88. Na
prática, porém, muito por timidez das cortes superiores, o mandado de injunção vinha sendo
utilizado com parcimônia.
Mas a decisão do Supremo sobre a greve de servidores ocorreu
no curso de um pedido de injunção. Tramitam no STF 53 dessas
ações. Em breve deverão ser julgados o aviso prévio superior a
30 dias e a aposentadoria especial de servidores, para os quais
faltam normas legais.
A nova atitude da corte tem
origem política. Além de ter passado por grande renovação -nos
últimos cinco anos, o presidente
Lula indicou 7 dos 11 ministros-,
consolidou-se na sociedade a
percepção de que o Legislativo se
furta à sua responsabilidade de
produzir leis. De fato. Passados
19 anos da promulgação da Carta, que exige a regulamentação
do direito de greve de servidores,
o Congresso não o fez.
Como a sociedade não pode
funcionar sem determinadas
normas, o vácuo legal começa a
ser preenchido pelo Supremo -o
que é em princípio positivo. A
concorrência tende a pôr o Legislativo para trabalhar.
Daí não segue que as decisões
das cortes serão sempre consonantes com os anseios da população -o Judiciário não é um Poder eleito. Há até mesmo o risco
de o ativismo do STF contaminar outras cortes e produzir
monstrengos como a decisão da
Justiça Eleitoral fluminense de
vetar candidatos vagamente acusados de "crimes graves" no pleito do ano que vem.
Diga-se, a propósito, que o excesso de declarações públicas sobre todo e qualquer assunto por
parte de alguns magistrados não
contribui para que se crie o clima
adequado a uma Justiça mais ativa. Se a corte máxima está falando com mais ímpeto nos autos,
deveria redobrar o cuidado e
portar-se com maior continência fora deles.
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