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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Lavoura arcaica
SÃO PAULO - Severino Inácio da
Silva é um tipo ideal do miserável
rural da era Lula, a começar pelo
nome: ele é o sem-terra, ou retirante (o "Severino"), que se "aquietou",
como ele mesmo diz, graças ao Bolsa Família (tornando-se um legítimo "Inácio da Silva").
Casado, 30 anos, quatro filhos,
morador da zona rural de Caruaru
(PE), esse Severino participou de
uma invasão de terra em 2002. Desiludiu-se. Hoje tem um boi e três
vacas e recebe R$ 78 do governo.
Completa a renda com bicos. Tem
mês, ele diz, "que o dinheirinho do
bico nem pareia com o do cartão".
Personagem de reportagem publicada ontem pela Folha, Severino
exemplifica como Lula vem desidratando os movimentos sem-terra. Dados oficiais mostram que caiu
muito o número de famílias que invadiram terras no primeiro mandato (redução de 32% entre 2003 e
2006) e despencou o número de famílias acampadas -eram 59 mil
em 2003, restaram 10 mil em 2006.
É claro que o Bolsa Família, sozinho, não explica a desmobilização
no campo. Mas não há dúvida de
que a rede de assistencialismo patrocinada por este governo criou
uma espécie de Estado de Mal-Estar Social, capaz de gerenciar a miséria e esvaziar a base humana manobrável pelo MST.
Além disso, ao contrário de FHC,
que lidou com a hostilidade dos
sem-terra, Lula estabeleceu com
eles um convívio menos tenso, ainda que ambíguo, baseado na cooptação e na maior tolerância. Sua política, uma espécie de abraço de urso, é muito mais eficaz para sufocar
a rebeldia potencial do movimento.
Sabemos que a utopia dos dirigentes do MST é autoritária e regressiva. Mas não é por causa dela
que o campo brasileiro segue sendo
um território selvagem. Talvez a
hora histórica da reforma agrária
tenha passado. O que não reduz a
importância dos sem-terra, cujo
papel civilizatório reside no enfrentamento dos desmandos da
nossa lavoura, embora moderna,
ainda tão arcaica.
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