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ALBA ZALUAR
Ânimos exaltados
ALMA, ESPÍRITO , índole, resolução, intenção ou força,
ânimo é adjetivo, ação, valor, decisão. Exaltado é exagerado,
excessivo, ardente, fanático, irascível. Com ânimo exaltado está aquele que só vê e escuta a si próprio e a mais ninguém. A tragédia cega de
quem só enxerga a si mesmo e que,
caído na armadilha do fanatismo,
se torna inimigo dos outros e de
si mesmo. Dos primeiros, com
exaltação; de si mesmo, sem nem
perceber.
É essa a situação dos que se dividem em torno da segurança nas cidades brasileiras. Em um dos ânimos exaltados estão aqueles que
acham favelados, pobres e negros
com direitos além dos constitucionais, prejudicando a cidade inteira
com suas construções em áreas de
proteção ambiental, em cima de
túneis e onde mais vá o querer incontrolado. Em outro, os que consideram favelas fábricas de bandidos que devem ser erradicados.
Com uma intenção irascível vão
os que agem como se fosse natural
jovens favelados se envolverem no
tráfico, matarem-se uns aos outros
em disputas comerciais e tratarem
os da favela vizinha como "alemães", isto é, inimigos mortais.
Com força igualmente irascível vão
os policiais que operam como se
matar bandidos ou todos os que parecem ser bandidos (mas podem
não ser) fosse a solução.
Entre uns e outros se posicionam profissionais e artistas que
querem construir pontes, meios de
comunicação, modos de compreensão mútua. Ainda é possível
evitar a guerra que se seguirá aos
ódios e vinganças inesquecíveis?
Vamos nós, os que conseguem ver
o trágico desfecho dessa guerra fratricida, nos omitir ou nos calar
diante das ameaças recebidas?
Em prol da nação que ainda nem
acabamos de construir, não. É possível dissolver o nó górdio da segurança pública com mais respeito à
lei vigente, aos direitos que implicam também responsabilidades recíprocas. Mas é preciso acrescentar
mais interlocução entre violadores
da lei e suas vítimas.
Nosso sistema de justiça proíbe
que acusados e vítimas se falem.
Nada mais absurdo. Como fazer
com que um jovem favelado que
matou alguém compreenda a extensão do dano que causou se os
parentes da vítima não podem dizer o que sentiram em juízo? Como
um policial que usou sua força excessivamente vai entender o estrago feito na favela atacada se suas
vítimas inocentes não puderam
falar?
É confrontando as partes afetadas que se chega a assumir a culpa
e, portanto, aceitar o castigo ou o
perdão. Assim é na Justiça dos Estados Unidos, assim foi o espírito
que presidiu a reconstrução da
África do Sul pós apartheid. Conciliação, punição e perdão sem esquecimento.
ALBA ZALUAR escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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