São Paulo, quarta-feira, 05 de novembro de 2008

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Concentrado bancário

Fusão que criou o maior banco do país eleva defesas contra crise, mas concentração de poder requer ações corretivas

O SISTEMA bancário brasileiro tem características que o tornam mais resistente a crises de confiança, como a que assolou as nações desenvolvidas nos últimos 40 dias -e que agora, parece, vai ficando para trás. Os negócios são concentrados em poucos bancos, a rede é moderna e integrada, os conglomerados são conservadores em suas operações e o capital nacional predomina, largamente, no controle das casas bancárias.
A fusão entre Itaú e Unibanco, uma das cartadas mais importantes na história das empresas financeiras do país, reforça todos esses fatores e, com isso, as linhas de defesa do Brasil contra turbulências de potencial desagregador. Consagra, além disso, a trajetória de sucesso de duas famílias de empresários que, nos últimos 50 anos, estiveram na vanguarda da modernização da atividade bancária no país.
O banco que emerge da fusão será o maior do país sob diversos critérios. Tomando-se por base o valor total dos ativos -os recursos que um banco destina a empréstimos, à compra de ações, títulos públicos e privados etc.-, o Itaú Unibanco S.A. passa a controlar 20% do mercado nacional. Bradesco, com uma fatia de 14%, e Banco do Brasil, que detém 16%, foram ultrapassados.
A solidez de um sistema bancário como o brasileiro, agora reforçada por uma fusão que desmente em definitivo os boatos sobre suas principiais instituições, deveria facilitar a travessia da crise global. As dificuldades ainda enfrentadas para destravar o crédito doméstico, contudo, indicam que essa vantagem teórica está sujeita a muitos obstáculos na prática.
A maioria dos trunfos da malha bancária brasileira, no que tange a solidez e solvência, implica também problemas que precisam ser combatidos. A concentração -cinco bancos dominam mais de 70% do mercado, índice que tende a aumentar no curto prazo- é um deles. A competição diminui, e os cidadãos ficam cada vez mais expostos a abusos nas tarifas e nas taxas de juros.
É difícil explicar por que os bancos brasileiros, quando emprestam recursos a seus clientes, acrescentam, em média, 26 pontos percentuais à taxa anual de juros que desembolsam para captar recursos -diferença, ou "spread", que subiu em 2008, apesar do fim da CPMF, que onerava os empréstimos. Sucessivas iniciativas para levar mais competição a esse mercado em concentração falharam no objetivo de aliviar o bolso dos clientes.
A aglutinação de poder de mercado também significa aumento da influência do lobby dos conglomerados bancários na política e sobre os órgãos reguladores. A freqüência e a rapidez com que profissionais trocam de posição entre o governo e o setor privado nesse segmento enfraquece a capacidade de arbitragem do poder público. A desenvoltura de grandes bancos no financiamento de campanhas, no Executivo e no Legislativo, também preocupa.
Sobre esses aspectos indesejáveis da concentração as autoridades deveriam agir com mais rigor a partir de agora, a fim de que o sistema bancário brasileiro, cada vez mais sólido e solvente, amplie sua contribuição para o desenvolvimento do país.


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