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TENDÊNCIAS/DEBATES
Instituições duradouras
MARCO MACIEL
As reformas institucionais devem ultrapassar o universo das alterações das leis eleitorais
e partidárias
A REFORMA eleitoral é tema que
raramente deixou de figurar
na agenda política do país. Não
me refiro só à agenda atual, mas também às dos séculos 20 e 19. A diferença reside na circunstância de que a expressão reforma política, hoje tão cediça, no século 19, com mais propriedade, se designava reforma eleitoral.
Este é, por sinal, o título do livro publicado em 1875 pelo conselheiro Antonio Pereira Pinto, à época diretor da
Secretaria da Câmara dos Deputados.
Nele estão as propostas que, entre os
anos de 1827 e 1874, tramitaram no
velho Parlamento do Império com o
objetivo de aprimorar a legislação
eleitoral do país.
Por ele se constata, por exemplo,
que o projeto do deputado Ferreira
França, em 1835, estabelecendo a
eleição direta, só adotada pela Lei Saraiva em 1881, nem sequer foi considerado objeto de deliberação quando
submetido ao turno regimental de
apreciação preliminar de discussão.
Hoje, é vezo generalizado referirmo-nos à reforma política tomando
esse termo como sinônimo de reforma eleitoral e das questões adjetivas
dela decorrentes. Se considerarmos
as hipóteses de trabalho sobre as
quais o Congresso tomará suas decisões, caso o faça na atual legislatura,
como seria desejável, é possível concluir que ela se circunscreverá a alguns poucos temas que mais despertam o interesse da opinião pública.
Nas propostas aprovadas pelo Senado Federal e agora em tramitação
na Câmara dos Deputados -por sinal,
há tempos em condições de serem
submetidas às deliberações do plenário- , os temas relevantes cingem-se
a três mudanças: 1) manutenção do
sistema proporcional para eleição dos
deputados, matéria constitucional
(art. 45), adotando-se a modalidade
do voto em listas fechadas e bloqueadas; 2) fidelidade partidária; e 3) adoção do financiamento público de
campanhas.
O financiamento público não é conseqüência do sistema de listas fechadas e bloqueadas. Ao contrário, o voto
em lista é requisito para viabilizar o
financiamento público, impraticável
com o modelo em vigor de listas abertas. Como repartir R$ 880 milhões de
recursos públicos nas eleições municipais entre 340 mil candidatos a vereador e mais de 15 mil candidatos a
prefeito, número do pleito de 2004?
A proposta do sistema de listas visa,
exatamente, a tornar possível a distribuição do financiamento. Não entre
os candidatos, o que seria inviável,
mas entre os partidos políticos, aos
quais caberia a condução das campanhas eleitorais.
Embora entenda que seja necessária a mudança do sistema eleitoral
brasileiro, para ensejar o fortalecimento dos partidos políticos, ele está
razoavelmente atualizado e testado.
Com exceção do Código Eleitoral, que
é da década de 60 do século passado,
mas sistematicamente atualizado, todo o restante do ordenamento legal
foi aprovado na década de 90. De forma suplementar, mais de 20 mil resoluções do TSE regulam aspectos normativos da legislação vigente e esclarecem dúvidas suscitadas por candidatos, partidos e parlamentares.
Esse sistema, portanto, não exige
modificações maiores do modelo em
vigor, salvo as imprescindíveis ao seu
aperfeiçoamento.
Resta considerar, por fim, que as alterações projetadas podem contribuir para aprimorar este ou aquele
aspecto das chamadas reformas institucionais. Mas, seguramente, estarão
ainda longe de solucionar o contencioso que constitui uma ampla, necessária e recomendável reforma, nos
termos em que a concebo.
As reformas institucionais, pelas
quais me empenho ao longo das três
últimas décadas, devem ultrapassar o
universo das alterações das leis eleitorais e partidárias; aprimorar o sistema de governo, removendo inclusive
as áreas de atrito entre Poderes; promover o fortalecimento da Federação, indispensável à efetiva descentralização do exercício do governo
num país de grande extensão territorial e de enorme expressão demográfica; e o revigoramento dos valores republicanos, ensejando, como verberou, há cem anos, Joaquim Murtinho,
"a republicanização da República".
Esse parece constituir, a meu juízo,
o nosso maior desafio -o de vertebrar duradouras instituições. As reformas, frise-se, são impostergáveis
para que, de uma democracia procedimental, passemos para uma democracia decisional, capaz de assegurar
regras claras, indispensáveis ao jogo
político compatível com a estabilidade institucional e a segurança jurídica
que a nação reclama.
MARCO MACIEL, 67, é senador da República pelo DEM-PE
e membro da Academia Brasileira de Letras. Foi vice-presidente da República (95-98 e 99-2002), ministro da Educação (governo Sarney) e governador de Pernambuco
(1978-85).
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