São Paulo, sábado, 05 de dezembro de 2009

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FERNANDO DE BARROS E SILVA

Na lama, ontem e hoje

SÃO PAULO - "Mortes, desabamentos, perdas materiais de toda ordem, momentos de desespero, transtornos e, mesmo para os não diretamente atingidos pelas enchentes, uma sensação de impotência e revolta. Não há dúvida de que choveu muito sobre São Paulo, como raramente acontece. Mas também é certo que o desastre de anteontem, de proporções inéditas, vinha sendo há muito anunciado".
Não, leitor, as linhas acima não foram escritas por este colunista. Também não se referem à tragédia de anteontem. Elas foram pinçadas de um editorial desta Folha de março de 1999, sugestivamente intitulado "Evitar novas tragédias".
Há dez anos, Gilberto Kassab havia deixado fazia pouco o cargo de secretário do Planejamento de Celso Pitta. A cidade, à deriva, vivia tempos exasperantes de desgoverno. O DEM do atual prefeito chamava-se PFL e estava em melhor situação. José Roberto Arruda, senador pelo PSDB, nem pensava em distribuir panetones aos pobres.
Deixemos por um instante a lama moral do DEM/PFL. São Paulo também afunda na sua lama. A cidade está suja, mas o prefeito diz que já é "um absurdo" gastar com limpeza um terço do que destina à saúde. Isso não o impede, no entanto, de elevar os gastos com publicidade de maneira pornográfica.
A catástrofe de anteontem matou crianças pobres que habitavam áreas de risco, provocou mais de 40 pontos de alagamento e um congestionamento de 218 km -ainda vamos ao Rio entalados na cidade.
São Paulo está sendo sistematicamente derrotada pelas enchentes, que aqui se tornaram parte da natureza, certas como a morte e os impostos. Sejam quais forem os investimentos estruturais e as obras de manutenção para enfrentar o problema, eles redundaram num fracasso exemplar. Sim, Kassab não pode ser responsabilizado sozinho pela imprevidência de décadas de seguidos governos. Ele é coautor de luxo do atual colapso urbano. A retórica técnico-gerencial do DEM não vale um panetone falsificado.


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