São Paulo, domingo, 05 de dezembro de 2010

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Cartão de visita

Medidas anunciadas pelo BC restringem crédito e tentam mitigar aumento dos juros, em estratégia vista com desconfiança pelo mercado

O Banco Central anunciou na manhã de sexta-feira medidas que vão restringir a oferta de financiamentos e encarecer o custo do dinheiro. Ao expor brevemente seus motivos, a autoridade monetária deu ênfase ao aspecto "macroprudencial" de suas determinações ao sistema bancário. Isto é, o BC pretendeu transmitir a ideia de que sua prioridade é evitar o aumento excessivo do crédito ao consumidor final de bens duráveis, em especial de automóveis.
Deixou em segundo plano o anúncio de que a iniciativa também visava a "retirada gradual dos incentivos introduzidos para minimizar os efeitos da crise" de 2008. Ou seja, o aumento da quantidade de dinheiro disponível nos bancos.
Poucos observadores da política monetária deram ouvidos à ordem das razões do BC. Economistas e a praça financeira consideraram que a ação teria o caráter de uma medida não muito ortodoxa de enxugamento de moeda com o objetivo de esfriar o mercado de crédito, o consumo e, dessa forma, a inflação.
Em suma, o BC determinou que os bancos recolham e deixem imobilizada uma parcela maior dos recursos que captam no mercado -e passou a exigir mais capital nas operações de crédito para pessoas físicas. Na prática, as taxas de juros subirão, os prazos de financiamento serão reduzidos e os financiadores de veículos exigirão entradas maiores.
São medidas prudentes, mas, num período de recrudescimento da inflação, provocaram a impressão de que a autoridade monetária estaria menos disposta a recorrer ao caminho tradicional de conter a alta de preços por meio da política de aumento da taxa de juros de curto prazo e da coordenação das expectativas de mercado.
O BC teria, nessa visão, lançado mão de um instrumento menos preciso, de efeitos menos testados ou mesmo "heterodoxo", na visão de alguns economistas. Para esses observadores mais radicais, a autoridade monetária "empurraria com a barriga" a decisão de elevar a taxa básica de juros, a Selic, no curto prazo sempre mais custosa e politicamente mais controversa.
Para os economistas considerados ortodoxos, essa estratégia se revelará, no médio e longo prazos, mais custosa, pois solapa a credibilidade do BC e mina sua capacidade de levar o mercado a acreditar que a inflação retrocederá.
Considera-se agora mais improvável que a autoridade monetária eleve a Selic já na próxima semana. Alguns analistas passaram mesmo a reduzir suas estimativas de alta dos juros para 2011.
O BC, já praticamente sob nova administração, parece ter anunciado sua primeira carta de intenções. Neste momento, apesar de todas as reivindicações do "mercado" e das considerações de economistas, parece impossível afirmar quão bem-sucedido será esse enfoque gradual e pouco ortodoxo. O teste do pudim ainda será comê-lo: verificar se a inflação volta à meta ou não. Caso a nova receita do BC desande, o início da gestão da equipe econômica de Dilma Rousseff não terá como evitar um sabor amargo.


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