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ELIANE CANTANHÊDE
Morte de câimbra
BRASÍLIA - A indústria fabrica mais e mais carros "flex" (a álcool e a gasolina), os usineiros fazem a festa, os
preços só sobem, os consumidores se
assustam e o governo ameaça intervir. Você não acha que está faltando
alguém nessa história?
Todos estão pensando no seu bolso
e no seu interesse, mas ninguém se
preocupa com a base dessa pirâmide:
o cortador de cana -um dos trabalhadores mais explorados do país.
É por isso que a CUT dá um grito e
a socióloga Maria Aparecida de Moraes Silva, professora visitante da
USP e titular da Unesp, quer saber o
que, de toda essa pujança, de todos
esses aumentos e de toda essa negociação em torno do "flex", vai sobrar
para os cortadores de cana, cujas
condições ela acompanha há mais de
30 anos, principalmente na região de
Ribeirão Preto (SP).
Esse trabalhador fica a ver navios
boa parte do ano e se esfalfa durante
a safra (abril a novembro) por migalhas, recebendo de R$ 2,20 a R$ 2,40
por tonelada de cana cortada. E ainda paga o transporte, a pensão, a comida. E manda o que sobra (deve ser
mágico) para casa. Sim, porque a
maioria é migrante. Deixa a família
e desce do norte de Minas e do Nordeste para ganhar a vida -ou a
morte.
De meados de 2004 a novembro de
2005, morreram 13 cortadores na região, geralmente homens jovens (o
mais velho tinha 55 anos). Há diferentes diagnósticos médicos, e os cortadores têm o seu próprio: "morte de
câimbra". Sabe o que é? A partir dos
anos 90, com as máquinas colheitadeiras, o sujeito tem como meta cortar 12 toneladas de cana por dia. Aí,
vem a câimbra nos braços, nas pernas e, enfim, no corpo todo. Na verdade, ele morre de estafa. Se é assim
em pleno Estado de São Paulo, imagine como deve ser no Nordeste -em
Alagoas, por exemplo.
Espera-se que governo e produtores
se entendam para um preço justo ao
consumidor. E que, um dia, os trabalhadores também tenham direitos
-a voz, a pressão e à própria vida.
@ - elianec@uol.com.br
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