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MÁRIO MAGALHÃES
Baixou o Bush, do Katrina
A VANÇAVA A contabilidade
fúnebre no derradeiro dia
de 2009 quando, no comecinho da tarde, indagaram um secretário municipal do Rio sobre o Réveillon. Ele rasgou o sorriso e festejou na TV: "Mudou nada, tá tudo
certo!". Um repórter emendou,
efusivo: com chuva ou sem chuva,
"a festa tem que continuar!". Ao
tripudiar da dor alheia, cunhou um
desses enganos que degradam o jornalismo.
A conta dos mortos no Estado na
quarta e na quinta-feira fecharia
em 19, a maioria na capital, e quase
a metade de crianças. Sobreveio a
desgraça em Angra nos Reis na madrugada seguinte. O Estado somava ontem 74 vidas abatidas desde o
dia 30 pelo aguaceiro.
A crônica do dar de ombros lustrou-se com Sérgio Cabral. Na
quinta, 31, sua assessoria informou
que ele permaneceria na casa de veraneio em Mangaratiba.
Logo o infortúnio castigou sua
vizinhança, a dezenas de quilômetros, em Angra. Nem por isso, na
sexta, o governador moveu-se ao morro da Carioca e à Ilha Grande.
Surgiu no sábado e cantou de galo:
não é demagogo para estar onde
quem deve agir nas primeiras 24 horas são os técnicos.
Abraçou o presidente Bush ausente no furacão Katrina de 2005 e
rejeitou o suor do prefeito Giuliani no 11 de Setembro de 2001.
Ridicularizou o aliado Eduardo
Paes, que na quinta de manhã já visitava as vítimas na zona norte carioca, concedendo um descanso ao
furor marqueteiro do dito choque de ordem.
O mesmo prefeito cuja administração não foi capaz de identificar
risco nos terrenos dos desabamentos e cujos desembolsos com publicidade dispararam, quem sabe à
falta de outra prioridade.
Cabral vangloriou-se: dobrou as
áreas de conservação, para restringir novas edificações, e vai radicalizar essa política.
Calou acerca do não cumprimento dos gastos previstos para
combater inundações -notórias
fontes de tragédias- na Baixada Fluminense e para prevenir calamidades no Estado.
Pareceu esquecer que no ano
passado autorizou normas mais
brandas para ocupar e construir
em Angra, nas encostas em que deslizamentos matam.
A presença do governante não se
destina a substituir o trabalho heroico de bombeiros e servidores da
Defesa Civil, mas a demonstrar determinação pública em socorrer,
amparar e prover meios de sobrevivência, ainda que o flagelo tantas
vezes se origine de ausência do Estado. Encarna o comando da ação e
estimula o empenho coletivo. Dá exemplo.
Nesse episódio, Cabral fez pelo
menos um seguidor: até ontem à
tarde, sua secretária de Assistência
Social, Benedita da Silva, não fora vista em Angra.
MÁRIO MAGALHÃES é repórter especial da Folha.
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