São Paulo, sábado, 06 de fevereiro de 2010

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Debaixo do pano

Tentativas de controle público sobre gastos de campanha esbarram, mais uma vez, nas resistências de partidos

NUMA RARA manifestação de convergência, representantes do PT, do DEM e do PSDB se insurgiram, nesta semana, contra uma norma visando o fim das chamadas "doações ocultas" nas campanhas eleitorais.
Pelo mecanismo até agora em vigor, não é difícil esconder da opinião pública os vínculos de interesse entre um político e seus financiadores privados. Basta que a empreiteira, o lobista ou o fornecedor de serviços para uma administração encaminhem suas contribuições não para a campanha individual de determinado postulante, mas para o partido a que pertence.
É o partido, então -através de suas instâncias federais-, quem se encarrega, por exemplo, de entregar os recursos ao candidato de um Estado ou município, cujas ligações com grupos específicos se veem, assim, dissolvidas na indistinção geral.
Recente determinação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) procura lançar alguma luz sobre essa noite em que, para usar de um velho bordão, todos os gatos são pardos. Pretende-se que, nas eleições deste ano, cada candidato seja obrigado a ter identificados os seus doadores no prazo máximo de um mês depois das eleições, e que tanto partidos quanto candidatos tenham contas bancárias próprias para suas finanças de campanha, promovendo-se a necessária separação dos respectivos caixas.
O ideal, na verdade, seria que em vez do tradicional e, a esta altura, anacrônico processo das prestações de contas posteriores ao pleito, fosse posto em prática mecanismo de acompanhamento on-line das doações e das despesas eleitorais. Mas a revolta de petistas, demistas e tucanos já se faz sentir com muito menos.
"Missão ingrata e impossível", diz o documento que assinaram em conjunto contra as novas, e relativamente limitadas, intenções do TSE. Como, no âmbito do tribunal, as resoluções quanto ao financiamento de campanha ainda estão em fase de consulta pública, os dirigentes partidários confiam reverter a tendência dos magistrados.
Repetem, a propósito de gastos eleitorais, um argumento conhecido: se se dificultam as condições para o financiamento legal de uma campanha, o resultado não será outro que não o de se intensificar o recurso ao caixa dois.
Ainda que devam reconhecer-se dificuldades práticas numa ou noutra medida, o princípio desse raciocínio valeria, a rigor, para qualquer legislação humana. "Se isto for proibido, serei obrigado a entrar na delinquência" -é o que dirá o desonesto de sempre.
Seria aliás saudável, num ambiente em que todos se dizem a favor da reforma política, ouvir a opinião de figuras como Dilma Rousseff, José Serra, Lula ou Aécio Neves acerca das doações ocultas. Enquanto as instâncias menores do PT, do PSDB e do DEM tratam de defender o sistema, seus próceres tendem a agir -como é sempre o caso nos negócios de campanha- como se nada tivessem a ver com isso.


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