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O aumento dos juros é hoje a melhor medida contra a volta da inflação?
NÃO
Prioridade ao ajuste fiscal
FERNANDO BEZERRA
A desvalorização de quase 80% do
real em relação ao dólar, ocorrida nas
últimas semanas, e seus impactos sobre
as expectativas de inflação têm levado
alguns analistas a propor um forte aumento das taxas de juros primárias da
economia, como proteção contra esses
riscos. Por uma série de razões, a proposta me parece equivocada.
A elevação das taxas de juros é um
instrumento usual de política econômica, utilizado para conter o movimento de desvalorização excessiva da
taxa de câmbio após mudanças no regime cambial. No entanto, é preciso levar
em conta que a taxa de juros real no
Brasil já vinha sendo mantida em níveis
muito elevados há vários anos e que,
ainda assim, a taxa nominal foi aumentada logo após a mudança do regime.
Além disso, é fundamental que não se
perca de vista a verdadeira origem do
problema. A pressão sobre a taxa de
câmbio (logo, sobre a inflação) ocorre
basicamente porque há uma enorme
incerteza quanto à capacidade do governo de eliminar o déficit fiscal e tirar
a dívida pública da insustentável trajetória de alta em que se encontra.
Além disso, fenômenos transitórios
(como a concentração de vencimentos
de títulos) concorreram para acentuar
o desequilíbrio entre oferta e demanda
de dólares, fato agravado pela situação
de interinidade na administração do
Banco Central por mais de um mês.
Nesse sentido, um novo aumento dos
juros, como o que foi adotado nesta semana pelo BC, não é solução, mas
agravante do problema. Como se sabe,
mais de 70% da dívida pública atualmente no mercado é pós-fixada, ou seja, paga no resgate os juros vigentes no
período. Com isso (e dado o perfil de
curto prazo da dívida), altas de juros
têm impacto imediato sobre as despesas financeiras do governo, aumentando a pressão sobre o déficit público.
Como se esses argumentos não bastassem, é preciso deixar muito claro
que o setor produtivo nacional não suportará uma nova elevação dos juros.
Punido por uma injusta e sufocante
carga tributária, onerado pelo chamado "custo Brasil" e submetido a elevadas taxas de juros, o produto brasileiro
perde cada vez mais a sua competitividade. Um novo aumento dos juros,
além de representar uma elevação do
"custo Brasil", pode significar a inviabilização definitiva da atividade produtiva nacional, ferindo de morte sua sonhada isonomia competitiva e impedindo-a de gerar empregos.
Um dos argumentos dos que sustentam a necessidade de elevação dos juros
é que as aplicações financeiras têm tido
remuneração negativa em termos reais,
o que tenderia a estimular o consumo e
elevar os índices de preços. No entanto,
ao mirar a inflação passada para fins de
política monetária, elevando os juros
porque a inflação mensal se elevou, o
Banco Central pode, na verdade, reforçar as práticas de indexação -ou, o
que é pior, sinalizar a expectativa de
uma trajetória de alta.
Em suma, o governo não deve usar a
elevação dos juros como principal instrumento para conter a inflação. Todos
os esforços devem ser envidados para
obter avanços significativos no plano
fiscal e recuperar a credibilidade do governo na condução da política econômica, o que inclui, prioritariamente, a
realização da reforma tributária. Só esses avanços podem dar à desvalorização sua dimensão desejável, alterando
os preços relativos na economia sem
ensejar uma nova espiral inflacionária.
Continua valendo, agora como no
passado, o princípio de que não há estabilização macroeconômica sem a
mudança do atual regime fiscal deficitário. Postergar a solução desse problema foi a causa do fracasso de experiências anteriores de estabilização e impõe
hoje um custo extraordinário à sociedade brasileira para que sejam preservadas as conquistas do Plano Real.
Com novos avanços na área fiscal e a
renegociação do acordo com o Fundo
Monetário Internacional, estou seguro
de que tanto a taxa de câmbio como as
expectativas inflacionárias tenderão a
ceder, abrindo espaço para a imprescindível redução dos juros e dando início, enfim, à recuperação da economia.
Fernando Bezerra, 57, empresário, é senador pelo
PMDB-RN e presidente da CNI (Confederação Nacional
da Indústria). Preside a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado.
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