São Paulo, terça, 6 de maio de 1997.

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Reformas: até quando o país pode esperar?


Comparado a outros 19 países latino-americanos, o Brasil é o mais lento em suas reformas
CARLOS EDUARDO MOREIRA FERREIRA

Há mais de dois anos as reformas tributária, administrativa e da Previdência, entre outras encaminhadas pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, arrastam-se pelo Congresso Nacional, sem que se tenha uma idéia clara de quando serão finalmente votadas.
Há um ano participamos de uma marcha a Brasília, juntamente com representantes de todos os setores produtivos, para dizer às autoridades federais, sobretudo aos legisladores, que não se poderia continuar investindo no aumento da produção, na oferta de serviços e na geração de empregos se não reformássemos a estrutura econômica.
Desde então, pouco se avançou diante da pressa e da necessidade da nação. Não se pretende atropelar o processo, mas a pergunta inevitável é: até quando o país pode esperar?
Não defendemos as reformas por razões ideológicas ou porque outros países as fizeram. Mas porque são necessárias, sob pena de perdermos definitivamente a batalha da competitividade e aumentarmos o ``gap'' que nos separa de outros países e blocos econômicos mais avançados. Numa economia definitivamente globalizada, as decisões se internacionalizaram. E o Brasil não é uma ilha, um lugar perdido do mundo protegido pela redoma do atraso.
Somos a oitava economia do mundo, o país líder do Mercosul, e, para interagirmos em condições de igualdade com nossos competidores, temos de reduzir dramaticamente custos e aumentar significativamente a produtividade. Temos de acabar com o ``custo Brasil'', enfim. E isso depende das reformas.
Recente estudo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) revela que, comparado a outros 19 países latino-americanos, o Brasil é o mais lento em suas reformas. No documento, a entidade aponta contradições gritantes, sobre as quais nossos congressistas deveriam refletir, para ampliar o universo de suas discussões e, quem sabe, tentar recuperar o tempo perdido.
Afirma o BID que o Brasil é o país da América Latina que apresenta a maior desigualdade de renda provocada pela falta de investimentos em educação. Isso cria dificuldades na incorporação de novas tecnologias na produção.
Outro aspecto negativo é que o nosso país tem uma das maiores cargas tributárias do mundo. No entanto, alinha-se entre os três únicos países latino-americanos com déficit fiscal superior a 3% do PIB, no conceito operacional. Enquanto outras nações apresentam em média uma carga tributária de 20%, arcamos com uma média de 30%, que chega a 36% no caso da indústria.
Nossa alíquota máxima de Imposto de Renda para pessoas jurídicas supera os 48%, contra a média de 31,5% na América Latina, 35,8% nos Estados Unidos e Europa e 31,5% nos países asiáticos. Essas distorções não afetam apenas nossa capacidade de competir no mercado externo. Prejudicam também nossos produtos aqui mesmo, na concorrência com os importados.
Para enfrentar essa situação, a reforma tributária é indispensável, articulada com um rigoroso ajuste fiscal por parte do poder público. Ajuste fiscal que também é condição essencial para a queda dos juros ainda estratosféricos praticados no Brasil. São medidas que, sem dúvida, estimulariam novos investimentos no setor produtivo e poderiam garantir um crescimento sustentável.
Tem razão, portanto, o presidente da República ao afirmar que, se o Congresso não aprovar as reformas estruturais, será difícil manter o crescimento da economia e a estabilidade de preços. Um Estado engessado, como ainda é o nosso, e prisioneiro do corporativismo não será nunca capaz de equacionar os graves problemas que afligem o país e de promover a justiça social.
Assim como, no passado recente, soubemos superar sem traumas o autoritarismo, devemos também superar esse conceito atrasado de Estado, democratizando finalmente a máquina administrativa.
Por tudo isso, é inadmissível que, a pretexto de se fazer avançar o processo reformista, se reforcem os privilégios espúrios, como recentemente se insinuou na votação da reforma administrativa, por meio do lamentável episódio do extrateto. Felizmente, a pronta e firme manifestação de repúdio de diversos segmentos e instituições da sociedade brasileira, entre os quais a Fiesp, conseguiu ajudar a brecar a regalia.
O momento é mais que oportuno para um apelo aos parlamentares, a fim de que viabilizem, até o final deste ano, a pauta das reformas estruturais de que o país tanta necessita. Pois em 1998, ano eleitoral, essas votações serão ainda mais difíceis de serem realizadas. O exercício desse dever, agora, terá a virtude de, num único episódio, ampliar a credibilidade do Congresso e apressar o encontro da nação com seu destino de desenvolvimento e prosperidade.

Carlos Eduardo Moreira Ferreira, 57, advogado e industrial, é presidente da Federação e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp/Ciesp).

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