|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CARLOS HEITOR CONY
Vítimas e assassinos
RIO DE JANEIRO - A tese não é nova e foi inventada, se não estou enganado, por juristas italianos, que são cobras em direito penal. No Brasil, ela
foi sustentada em alguns casos por
Evandro Lins e Silva em seus tempos
de glória nos tribunais, tempos que se
prolongaram até às vésperas de sua
morte, quando defendeu José Rainha
e conseguiu sua absolvição.
Trata-se da vitimologia -a teoria
de que a vítima, se não é a culpada
pelo crime que a matou, foi cúmplice
de seu próprio assassinato, fornecendo motivos ao criminoso.
É evidente que há casos e casos.
Lembro o do motorista de ônibus
que, sem querer, deu uma fechada
num carro que ia ao lado. O prejudicado começou a ofender o motorista,
postou-se à frente do ônibus e começou a insultá-lo com palavras cada
vez mais fortes e letais. O motorista
pediu desculpas, buzinou pedindo
passagem. Nada. Continuou a receber a enxurrada de insultos. O calor
era tremendo, os passageiros reclamavam, o motorista perdeu a paciência, saltou do ônibus com uma
barra de ferro e abriu a cabeça do sujeito. Pegou pena leve: caso típico da
vítima ter provocado o assassino.
Conversei bastante com Evandro,
que escolhi como padrinho quando
entrei para a ABL. Ele dizia que o advogado de defesa pode usar todos os
recursos para obter a absolvição ou a
diminuição da pena de seu cliente.
Afinal, não são os advogados que julgam, mas o corpo de jurados, que responde aos quesitos formulados pelo
juiz.
No caso do jornalista que matou a
namorada em Ibiúna, a tese da vítima ter provocado o crime é mais do
que furada. A moça simplesmente
não mais queria manter o caso com
ele, estava em outra -ou com outro.
A prevalecer a tese em todos os casos,
quem matou César foi o próprio César. Quem matou Kennedy foi o próprio Kennedy. E quem matou Jesus
Cristo foi ele próprio, dando aos seus
algozes o motivo.
Texto Anterior: Brasília - Fernando Rodrigues: Um país frágil Próximo Texto: Luciano Mendes de Almeida: Ser amado e amar Índice
|