São Paulo, terça-feira, 06 de maio de 2008

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Oportunidades na cúpula de Lima

STEFAN BOGDAN SALEJ


Não é só a integração cultural e histórica que liga estas duas regiões, América Latina-Caribe e União Européia: é o futuro


PODEM AMÉRICA Latina e Caribe e União Européia formar uma aliança que vai gerar maiores benefícios para as populações mais pobres das duas regiões, melhor qualidade ambiental e melhor qualidade de vida? A América Latina tem como prioridade a América Latina. A União Européia também tem a sua prioridade, que é a própria União Européia.
Mas as duas regiões podem viver uma sem a outra? E como podem conviver juntas num jogo ganha-ganha? Algumas dessas respostas serão dadas em Lima (Peru) em meados deste mês, quando será realizada a 5ª Cúpula União Européia/América Latina-Caribe. A primeira reunião foi há dez anos, no Rio de Janeiro (mais um pioneirismo do Itamaraty), e a última foi em Viena (Áustria), em 2006.
Os temas dessa reunião serão a luta contra a pobreza e as mudanças climáticas. A novidade é que a União Européia é presidida agora pela Eslovênia, o primeiro dos novos membros a desempenhar a função. Pequeno, mas diplomaticamente e economicamente ativo, procura um foco claro na reunião de Lima.
O primeiro foco são os dois temas interligados (luta contra a pobreza e mudanças climáticas). O segundo é conseguir resultados mensuráveis da reunião de 60 chefes de governo e Estado. E o terceiro é mostrar que, mesmo sendo a União Européia o maior investidor na América Latina e seu principal parceiro comercial, isso não basta: um continente não sobrevive sem o outro. Não é só a integração cultural e histórica que liga as duas regiões: é o futuro.
A Europa ajudou a criar pobreza na América Latina como ajuda, com os investimentos (mais de 5 milhões de postos de trabalho criados na região com os investimentos europeus), a criar riqueza. Mas precisa ter a humildade de reconhecer não só o enorme potencial de desenvolvimento da região como também a sua capacidade de gerar tal potencial.
Outro dia, numa reunião de diplomatas das duas regiões, alguém lembrou que não há mais ditaduras militares na América Latina. Nem governos fascistas na Europa. Que as duas regiões são hoje regidas por democratas legalmente eleitos. Que há uma radical mudança na percepção da administração pública e fiscal na região latino-americana. E que a transformação do problema social, de pobreza, em desafio com soluções de desenvolvimento tem trazido resultados positivos além de qualquer expectativa.
O encontro de Lima, para o qual foram feitas 13 reuniões preparatórias principais, é a oportunidade para discutir problemas e indicar soluções. A Eslovênia, cujo presidente, Danilo Türk, visitou o Peru, o Brasil, a Colômbia e a Venezuela para conversar sobre os preparativos para a reunião, é o parceiro ideal para esse momento.
Não é um país de interesses econômicos e históricos de maior importância na região, mas nem de longe é teleguiado por outros. É um "honest broker" (mediador isento) que quer de fato marcar sua presença na presidência da União Européia com resultados positivos na parceria entre os países.
Para o Brasil, de quem se pede sempre maior participação no cenário internacional, é mais uma oportunidade para mostrar que os biocombustíveis são uma contribuição positiva para os problemas ambientais mundiais, que o país ajuda a resolver os problemas da fome e de fornecimento de alimentos no mundo e que é inovador e líder no combate à pobreza.
A União Européia pode ajudar a resolver alguns problemas, sejam políticos ou econômicos, na América Latina. Mas tem que se convencer de que a América Latina pode liderar suas soluções ela mesma (veja o caso do Haiti e a recente crise entre Colômbia e Equador).
A Europa tem que reconhecer que só a parceria a longo prazo entre as duas regiões pode dar bons resultados. E a América Latina, que, no seu processo de integração (em Lima provavelmente serão lançadas as bases de nova negociação entre União Européia e Mercosul), pode ter na Europa um parceiro mais confiável. Ou seja, em Lima, com Cubillas ou não, o jogo é só ganha-ganha.


STEFAN BOGDAN SALEJ , 64, administrador de empresas com pós-graduação em ciências políticas pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), é embaixador enviado especial do ministro das Relações Exteriores da Eslovênia para a América Latina. Foi vice-presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria) e presidente da Federação das Indústrias de Minas Gerais.

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