São Paulo, quarta-feira, 06 de setembro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Um Poder Judiciário atuante

HÉLIO BICUDO

Seria importante que o novo chefe do Executivo paulista retomasse a idéia de criar distritos judiciários, nem que fosse uma experiência-piloto

EM VEZ DE juizados especiais para pequenas causas, seria mais lógica a criação de distritos judiciários com plena competência, já que aqueles perderam os fundamentos que levaram à sua instituição: atendimento rápido de causas de pequeno valor, o que permitiria o desafogo da Justiça qualificada para os procedimentos de maior conteúdo -quer dizer, em última análise, as de real valor monetário.
Os juizados de pequenas causas, desde sua instituição, foram considerados órgãos de uma Justiça de segunda categoria, com magistrados deslocados de suas carreiras, e servindo, muitas vezes, de punição àqueles que deviam contas aos órgãos superiores da magistratura.
Daí não ter maior sentido o acordo realizado sob os auspícios do Conselho Nacional de Justiça para serem retomados os princípios que teriam norteado a criação dessa chamada "Justiça de pequenas causas".
A sociedade civil e os magistrados que dela fazem parte precisam voltar seus olhos para as necessidades de uma Justiça real, igual para todos e a todos acessível, sem distinção de valor econômico.
Esse ideal não pode ser alcançado no sistema atual, de uma Justiça centralizada nos fóruns ou nos Palácios de Justiça. Essa centralização é, sem dúvida, a maior causa da demora na solução dos conflitos, não só da alçada civil, mas, por igual, da área criminal.
Vale recordar que, lá pelos idos dos anos 60 do século passado, o então governador de São Paulo, professor Carlos Alberto Alves de Carvalho Pinto, com a colaboração do Tribunal de Justiça do Estado, apresentou à Assembléia Legislativa um projeto de lei que criava 50 distritos judiciários numa cidade que, à época, tinha uma população de pouco menos de 4 milhões de habitantes.
Tratava-se de um projeto ambicioso, pois os distritos em questão englobavam, num só módulo, o juiz, o promotor, o delegado e os advogados; um contingente policial e uma prisão tendo em vista o cumprimento de penas impostas no distrito (prisão que não atenderia mais do que 100 detentos).
Essa proposta não foi além, porque Ademar de Barros, que sucedeu a Carvalho Pinto, não se interessou em aprová-la e implementá-la.
Pois bem. Hoje, a cidade de São Paulo, com mais de 10 milhões de habitantes, convive com fóruns centralizados e uns poucos fóruns regionais, incapazes de atender a sua população, estimulando, no campo penal, a impunidade, que é a mola propulsora da violência.
A Justiça atual se caracteriza pela burocratização. Os juízes vão ao fórum entre 13h e 17h, quando dão andamento aos processos, sem nenhum contato com seus jurisdicionados. São funcionários, e não juízes, como deveriam se qualificar.
São Paulo elegerá, em breve, seu governador. Seria importante que o novo chefe do Executivo paulista retomasse essa idéia, nem que fosse para fazer uma experiência-piloto, numa área demarcada à guisa de um distrito. Nela, atuariam membros da magistratura, do Ministério Público, da polícia e do setor penitenciário, e eles exerceriam competência plena -civil e criminal.
Quem sabe essa experiência poderia ser o começo de um novo sistema de distribuição da Justiça, inclusive do ponto de vista prisional. O candidato eleito o dirá.


HÉLIO BICUDO, 84, advogado e jornalista, é presidente da Fundação Interamericana de Defesa dos Direitos Humanos. Foi vice-prefeito do município de São Paulo (gestão Marta Suplicy), deputado federal pelo PT-SP (1990-94 e 1995-98). É autor de "Meu Depoimento sobre o Esquadrão da Morte", entre outros livros.

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