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FERNANDO CANZIAN
Marolinha
de Itu
POR MÉRITO DO governo Lula
e da recente farra de crédito
mundial, que vinha alavancando a economia global como um
todo até a atual crise explodir, a
classe C no Brasil engloba hoje a
maioria da população: 54% dos
brasileiros fazem parte dela.
Até o ano passado, eram 46%. No
início do governo Lula, um terço.
Por trás dos percentuais, cerca de
41 milhões de brasileiros entraram
ou fizeram a travessia para uma vida mais confortável. A maioria embarcou na classe C ao deixar a D/E.
A divisão em classes A/B, C e
D/E é comum no mercado e visa
apurar o poder aquisitivo. Leva em
conta itens de consumo e seu número nos domicílios e apura ainda
o grau de instrução do chefe de família. Embora ela não reflita, necessariamente, uma melhora estrutural na vida do entrevistado
(ele pode ter duas TVs e um carro e
ainda morar em uma favela), a classificação dá uma boa idéia dos níveis de consumo, do pulso da economia e do conforto material.
Infelizmente, é mais do que razoável esperar agora um retrocesso
nessa firme e recente migração na
direção de uma vida melhor.
Mas uma das "vantagens" dessa
crise é que ela parece seguir o mesmo roteiro em todo lugar. Outra,
no caso do Brasil, é que, apesar da
sua velocidade, seu desenrolar aqui
acontece com um certo "delay": vimos ocorrer apenas em novembro
aqui o que se deu em outubro nos
EUA. Também começamos mais
devagar, embora devamos ir igualmente longe em suas entranhas.
O primeiro ato da crise foi o travamento do crédito. Nos EUA, ele
representa 140% do PIB. No Brasil,
menos de 40%. Mas era o que permitia atravessar a ponte D/E-C
com certa velocidade. O segundo
ato está em cena: desemprego e
cortes na produção e nos investimentos. Os mais atentos assistem à
violência com que ele ocorre no
palco dos EUA com mexidas cada
vez mais nervosas e aflitas sobre
suas poltronas brasileiras.
Com atores e cenários distintos,
e algumas variações, é bem provável que o roteiro continue avançando de forma parecida para todos.
No caso do Brasil, finalmente
houve o reconhecimento do governo Lula de que o "tsunami" externo
não será apenas uma "marolinha".
Mas, até aqui, o "delay" lulista e dos
70% que o apóiam é ainda maior
que o da dinâmica da própria crise.
FERNANDO CANZIAN é repórter especial.
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