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TENDÊNCIAS/DEBATES
A terceira reforma da Previdência
AMIR LANDO
A terceira reforma da Previdência Social está acontecendo, é permanente e tem um nome: choque de
gestão. O que a sociedade brasileira não
suportaria mais é uma nova reforma
constitucional nos moldes das que foram feitas em 1998 e em 2003 -muito
necessárias-, por um motivo muito
simples: o brasileiro não suporta mais
aumento de alíquota e redução de benefício. Uma reforma assim só reforçará
os interesses de quem defende a privatização do sistema previdenciário. E nós
somos contra isso.
Inspirado nas reformas microeconômicas, o choque de gestão é feito de
muitas minirreformas. Por isso, é silencioso. Sob seu guarda-chuva, criamos a
Assessoria de Gerenciamento de Riscos,
para identificar falhas e propor soluções; a força-tarefa, espalhada por todo
o país, responsável pela prisão de 150
fraudadores no ano passado; a Previc,
superintendência para cuidar dos fundos fechados de pensão; e a Secretaria
de Receita Previdenciária, inspirada na
Receita Federal e nas modernas técnicas
de recuperação de créditos. Além disso,
regulamentamos os fundos de pensão
dos servidores do Estado e vamos iniciar a reconstrução do cadastro, para
simplificar a concessão e a emissão de
benefícios.
Seu objetivo principal: humanizar a
Previdência Social brasileira. O meio
para cumprir esse objetivo: dotar a sociedade brasileira de novas instituições,
que dêem ao Estado os mecanismos necessários à promoção do desenvolvimento sustentável de longo prazo. Esse
é o nosso compromisso com as novas
gerações. A ação gerencial é tudo o que
uma nova e problemática reforma constitucional não representaria.
Numa perspectiva histórica, a reforma de 2003, que introduziu o conceito
de tempo de contribuição para todos os
trabalhadores e modificou a idade mínima para servidores públicos, foi fundamental. Mas os problemas do dia-a-dia continuam existindo. A qualidade
do atendimento e as fraudes ainda afetam lamentavelmente a credibilidade
da Previdência. Novas reformas constitucionais, embora possam ser defensáveis sob alguns aspectos, não conseguiriam mudar esse quadro.
Os efeitos dessas reformas se limitam,
de modo geral, aos benefícios por idade
ou ao tempo de contribuição. Não levam em conta, por exemplo, os benefícios de risco, como aposentadorias por
invalidez, auxílios-doença e pensões
por morte, que atingem 38% dos inativos com até 55 anos de idade. Esses dados demonstram que não se trata de um
problema relativo aos idosos. Relaciona-se também aos benefícios por invalidez, doenças e morte prematura.
Numa perspectiva histórica, a reforma de 2003 foi fundamental. Mas problemas continuam existindo
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Temos problemas. Reconhecemos isso e não fechamos a porta ao debate.
Mas acreditamos que o choque de gestão deve demonstrar toda a força de seu
efeito nas contas da Previdência antes
do debate sobre uma nova reforma
constitucional. Escolhemos o caminho
mais difícil. O do trabalho permanente.
Não negamos que nossa estrutura nos
grandes centros urbanos deixa a desejar. Precisamos de mais pessoal e equipamentos para prestar um serviço de
melhor qualidade. Em muitas grandes
cidades, as filas são um problema. E
persistem as fraudes contra o sistema,
entre muitos problemas a encarar.
Mas temos uma resposta para cada
um desses problemas apresentados. O
sucateamento será solucionado com a
compra de novas máquinas, o Banco
Interamericano de Desenvolvimento
(BID) investirá US$ 188 milhões para
substituir a arquitetura de nossos sistemas de computadores, da década de 70,
por uma arquitetura moderna, compatível com a grandeza que a Previdência
adquiriu de lá para cá; criamos forças-tarefas, que já mandaram para a prisão
quase 150 pessoas.
Nossa preocupação, portanto, é bem
outra. O debate precipitado abre caminho à crítica fácil e coloca a Previdência
Social do Brasil em situação difícil: fragiliza nossa imagem e, assim, proporciona, de forma equivocada, a munição
desejada por muitos grupos econômicos para propor a sua privatização; gera
tensão no relacionamento entre os servidores e os cidadãos que vão às agências; e desacredita a instituição, estimulando a cultura da sonegação, prejudicando e colocando em risco a manutenção do sistema, e aumentando a dívida.
Quem realmente sai prejudicado com
o descrédito generalizado da Previdência é o cidadão. Entre outras conseqüências, todas muito graves, mencionamos uma, a título de demonstração: o
descrédito da instituição provoca em
profissionais autônomos (domésticas,
motoboys, pedreiros, cabeleireiros) a
idéia de que não têm a necessidade de
contribuir, ou de que a contribuição, sacrificada, não trará benefícios. Não é
verdade. Grande parte dessas pessoas
irá necessitar, durante a vida, de alguns
desses benefícios. Caso não contribuam, não terão o direito a eles e poderão estar condenados a passar a idade
madura na linha da necessidade e da
miséria. Por isso, entre nós aqui da Previdência, o choque de gestão também é
conhecido por choque de inclusão.
Amir Lando, 60, bacharel em direito, é ministro
da Previdência Social. Foi senador pelo
PMDB-RO (1999-2003).
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