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TENDÊNCIAS/DEBATES
Falta transparência na segurança pública
PAULO DE MESQUITA NETO
A Secretaria da Segurança Pública, com Serra, parece continuar prática adotada por Alckmin de divulgar estatísticas parciais
SAEM ALCKMIN e Saulo, entram
Serra e Marzagão. Entretanto,
pelo menos no início do novo governo, a expectativa de mudança na
segurança pública -expectativa de
todos que ainda se lembram da crise
de maio-agosto de 2006- parece não
se confirmar. Continua faltando
transparência e sobrando encenação
na Secretaria da Segurança Pública.
São Paulo tem o mérito de divulgar
regularmente estatísticas sobre ocorrências criminais e mortes em ações
policiais, o que não acontece em outros Estados, com exceção do Rio de
Janeiro. Apesar de necessário, divulgar estatísticas não é suficiente para
assegurar transparência. Muito depende de quais são as estatísticas e como são divulgadas.
A Secretaria da Segurança Pública
tem prazer em divulgar estatísticas
criminais em declínio -como acontece com as estatísticas de homicídio,
em queda há seis anos- e se apressa
em atribuir reduções nas ocorrências
de homicídio à eficácia da polícia.
A divulgação das estatísticas de
mortes em ações policiais, entretanto, é sempre uma ducha de água fria
na pretensão do governo de melhorar
a imagem da polícia. Na tentativa de
minimizar o problema do elevadíssimo número de mortes em ações policiais no Estado, a secretaria, no governo Serra, parece continuar prática
adotada no governo Alckmin de divulgar, por meio da imprensa, estatísticas parciais e explicações fundadas
em interesses da secretaria e das polícias, e não na análise dos fatos.
Quantas pessoas foram mortas por
policiais em 2006? Segundo os dados
divulgados pela secretaria à imprensa, foram 533. Por que esse número
foi muito superior ao registrado em
2005 (300)? Segundo a secretaria,
sem mencionar os ataques do PCC e
os revides da polícia em 2006, porque
o número de 2005 foi o mais baixo
dos últimos anos.
Acontece que 533 (542, segundo
dados publicados no "Diário Oficial")
é o número de pessoas mortas por policias em serviço, consideradas apenas as mortes registradas como "resistência seguida de morte". O número não inclui as mortes registradas como "resistência seguida de morte"
que aconteceram quando os policiais
estavam em folga. Também não inclui
o número de pessoas mortas por policiais, em serviço e em folga, em casos
registrados como "homicídio doloso"
ou "homicídio culposo".
Em 2006, o número total de pessoas mortas por policiais em serviço e
fora de serviço foi 708 (33% a mais
que o número divulgado pela secretaria): 570 mortes registradas como resistência seguida de morte e 138 registradas como "homicídio" doloso
ou culposo. Em 2005, o número total
de pessoas mortas por policiais foi
469 (56% a mais que as 300 mortes
divulgadas pela secretaria). Número
superior ao de pessoas mortas por policiais de todas as polícias em todos os
Estados dos Estados Unidos, que não
passa de 400 por ano desde 1995.
Se 2005 foi o ano com o menor número de pessoas mortas por policiais
nos últimos anos, isso se deve ao fato
de que, a partir de 2000, com picos
em 2002 e 2003, houve um dramático
aumento no número de pessoas mortas por policiais comparativamente à
década de 1990. Em 2003, 975 pessoas foram mortas por policias no Estado de São Paulo, número inferior
apenas aos registrados em 1991 e 1992
(1.086 e 1.458, respectivamente).
A partir do ano 2000, diminuiu a
violência na sociedade e a violência
contra policiais. Por que não diminuiu a violência policial? Por que e como 705 pessoas foram mortas por policias no Estado de São Paulo somente em 2006? Em que medida a violência da polícia depende da violência na
sociedade e da violência contra a polícia? E da política do governo? Da gestão das organizações policiais? Ou do
controle interno e externo da polícia?
Respostas a essas perguntas são
fundamentais para ações corretivas
produzirem os resultados esperados.
Não só para melhorar a imagem da
polícia, aumentar a confiança da população na polícia, o que é fundamental, mas para sustentar o processo de
redução dos homicídios e da violência
no Estado. Porém, essas respostas dependem de maior transparência na
administração da segurança pública
-o que permitiria substituir o senso
comum e a ideologia por conclusões
de pesquisas e discussões públicas.
Transparência, respeito à lei e aos
direitos humanos e participação social são fundamentais para o sucesso
de uma política de segurança pública.
Quando a transparência falta, é impossível sustentar o respeito à lei e
aos direitos humanos e a participação
social. O resultado mais visível do déficit em transparência na área da segurança pública no governo Alckmin
foi a crise de maio-agosto de 2006.
PAULO DE MESQUITA NETO, 45, doutor em ciência política pela Universidade de Columbia (EUA), é coordenador da área de Monitoramento dos Direitos Humanos do Núcleo de Estudos da Violência da USP.
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