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RUY CASTRO
Matéria líquida
RIO DE JANEIRO - "Alô, nação
quemerdeense!". O grito de guerra
do bloco Que Merda É Essa?
-ecoando o das escolas de samba,
que se dirige às, estas, sim, nações
mangueirense, imperiana, leopoldinense- vai se fazer ouvir hoje em
Ipanema e acionar milhares de foliões. Como este, cerca de mil outros blocos sairão às ruas do Rio nos
próximos dias, e muitos deles mais
de uma vez até o Carnaval.
É a vitória da folia sobre os nostálgicos que passaram as últimas
décadas chorando o "fim" do Carnaval carioca, apenas porque ele
não se parecia mais com o dos bondes à fantasia, do baile de gala no
Municipal e das marchinhas de Lalá ou Braguinha. Eu próprio, em
certa época, deixei-me contagiar
por esse sentimento negativo, até
aprender, com o falecido Albino Pinheiro, que a decadência não está
no Carnaval, mas em nós mesmos.
Mas o que me angustiava, e com
razão, era ver o Carnaval reduzido
ao desfile das escolas -em certa
época, para meu desespero, eles pareceram se tornar sinônimos. E, no
desfile em si, a opulência visual esmagando a música, com as escolas
incapazes de produzir sambas decentes e com letras que fugissem
aos clichês.
Por sorte, os blocos voltaram
-maciça e espontaneamente, sem
um centavo oficial- e arrastaram o
carioca para as ruas, como faziam
no passado. Hoje, a cada Carnaval,
eles movimentam milhões de pessoas, cantando, brincando e mandando para dentro hectolitros de
cerveja per capita. O problema é
que, assim como a alegria, a cerveja
também precisa ser botada para fora. Haja xixi, e o poder público alega
não ter verba para banheiros químicos suficientes.
Só vejo uma solução: os fabricantes de cerveja fornecerem os banheiros, às centenas, aos milhares,
se preciso. Afinal, são eles que também fornecem a matéria-prima.
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