|
Próximo Texto | Índice
Editoriais
editoriais@uol.com.br
Terra de gigantes
Conflitos entre EUA e China se avolumam e devem ser cada vez mais frequentes, mas não a ponto de se radicalizarem
AINDA não se passaram
12 meses desde a viagem inaugural de Hillary Clinton, como secretária de Estado dos EUA, à
China. Noticiava-se então a guinada "realista" da política externa norte-americana, sob Barack
Obama. Nada de lições sobre valores e direitos universais; todo
cuidado para não ofender Pequim em temas sensíveis, como
Tibete ou liberdade de imprensa.
Diplomatas chineses comemoraram a visita de Clinton e consideraram que a época das reprimendas americanas havia chegado ao fim. Menos de um ano depois, a mesma secretária de Estado ataca publicamente os limites
impostos pela China à liberdade
de opinião na internet, e Obama
receberá o dalai-lama, líder separatista tibetano, na Casa Branca.
Não menos significativo, os
EUA anunciam a venda de helicópteros, baterias antimísseis e
navios a Taiwan, ilha considerada pela China como uma Província rebelde, embora tenha governo autônomo há 60 anos.
As razões imediatas da mudança dizem respeito à política interna norte-americana. Obama
tem se enfraquecido numa velocidade impressionante. A resistência ideológica dos conservadores se galvanizou no período
de discussão da reforma do sistema de saúde proposta pelo presidente -e conseguiu sua primeira
grande vitória ao eleger um republicano para a vaga aberta no
Senado depois da morte do lendário democrata Ted Kennedy.
Uma das principais pechas associadas à imagem de Obama,
por essa oposição revigorada, é a
de ser um presidente fraco. Não à
toa, sua inclinação por uma estratégia mais multilateral tem sido apresentada como sinal de
debilidade.
Não deixou de ser uma oportunidade para o democrata, portanto, a denúncia da ferramenta
de buscas Google de que hackers,
provavelmente ligados ao governo chinês, haviam tentado violar
e-mails de dissidentes políticos
geridos pela empresa. Ato contínuo, os americanos subiram o
tom do discurso público contra a
China. O endurecimento retórico estendeu-se ao campo econômico numa renovada referência
ao artificialismo da política cambial chinesa.
A China avança econômica,
militar e politicamente, representando a única ameaça real à
incontestável hegemonia dos
EUA desde o colapso soviético.
Confrontos de interesse crescentes serão inevitáveis, entre os
dois gigantes, no futuro. Provavelmente nada que se compare à
lógica bipolar da Guerra Fria.
Enquanto os EUA e a URSS capitaneavam mundos políticos,
ideológicos e comerciais quase
estanques, chineses e americanos são interdependentes na
economia -e o regime vigente
na China é capitalismo de Estado
sob retórica comunista. Nenhum
dos dois, além disso, pode abrir
mão da interlocução e do comércio com um grupo crescente de
países, o que contribui para o
equilíbrio político internacional.
É de esperar, portanto, que as
contendas aconteçam, mas não
se radicalizem -e que sejam, ao
menos em parte, dirimidas no
âmbito do debate multilateral.
Próximo Texto: Editoriais: Inovar para sobreviver
Índice
|