São Paulo, domingo, 7 de fevereiro de 1999

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Na dança dos juros

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Até outro dia, a taxa de juros tinha de ser alta, para seduzir os especuladores. Agora, tem de ser mais alta, para espantar os consumidores.
A perversidade dessa lógica econômica ignora as necessidades dos seres humanos. Se os juros têm de ficar elevados para esfriar a demanda e controlar a inflação, é bom lembrar que sem consumo não há razão para produzir e sem produção não há razão para manter empregos.
É isso que se pretende com a renegociação dos US$ 41,5 bilhões? E as famílias brasileiras, como ficam nessa? E as empresas, o que vão fazer? Exportar tudo?
Não há dúvida de que o realismo do câmbio estimulará as exportações e ajudará a recompor as nossas reservas cambiais. Mas isso é meio, e não fim. O fim é preservar a saúde do povo, melhorar a educação e elevar o seu padrão de vida.
Se nada disso pode ser atingido, estamos num barco que pode até chegar ao porto pretendido, mas encontrará lá uma terra arrasada e um doloroso vazio humano.
Enquanto na Inglaterra, na Alemanha, nos Estados Unidos e em outros países os juros baixam para se ativarem as economias, no Brasil eles não param de subir.
É uma história triste. Parece uma fatalidade. O dicionário define a fatalidade como a situação na qual o curso do mundo e a existência humana são infalivelmente dirigidos e determinados por uma entidade superior, cega ou insondável, sendo que dela ninguém escapa.
No caso brasileiro, a produção, o consumo e o emprego passaram a ser determinados por essa nefasta entidade, a taxa de juros, qualificada como "escorchante" (quando ainda era mais baixa) pelo presidente da República.
Os dados são inequívocos: quando o PIB cresce, o desemprego decresce, e vice-versa. Em 1994, o PIB "per capita" cresceu 4,3%, e a taxa de desemprego desceu para 6,4%. Em 1997, o PIB cresceu apenas 1,5%, e o desemprego ultrapassou a casa dos 8%. Para 1999, com a previsão de um PIB de -3%, só se pode esperar 9% ou 10% de desemprego- há quem estime 12%.
Uma vez, Margaret Thatcher disse a um ministro que pretendia praticar o mesmo tipo de maldade contra a economia britânica: "Se deixarmos de lado as raízes históricas da sociedade inglesa, os princípios filosóficos da nossa democracia, a tradição de respeito que sempre tivemos pelo nosso povo e as necessidades econômicas e sociais de cada um dos cidadãos da Inglaterra, a sua lógica está rigorosamente correta...".
O Brasil está precisando mais de ações pragmáticas e menos de exercícios de lógica. Não seria prudente religar o fio-terra dos que se dizem donos do nosso destino?


Antonio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.



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