São Paulo, Domingo, 07 de Março de 1999
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Instituições trabalhistas

ANTONIO ERMÍRIO DE MORAES

Surgiram na última semana inúmeras discussões sobre a razão de ser da Justiça do Trabalho no Brasil. Alguns advogam a sua extinção. Muitos querem o fim dos juízes classistas. Outros restringem as críticas ao Tribunal Superior do Trabalho.
A complexidade do assunto vai muito além do que pode ser abrigado pelos rápidos debates de televisão ou breves notícias de jornal. Ao mesmo tempo, a rediscussão das instituições trabalhistas no Brasil é urgente e necessária.
Sempre entendi que a Justiça do Trabalho é o escoadouro final de um conjunto de leis e decretos, dentro do qual são realizadas as negociações entre empregados e empregadores. A Justiça entra quando o entendimento acaba.
É por demais conhecido que o Brasil possui um quadro legal demasiadamente detalhado, inflexível e estimulador de conflitos. Em lugar de fixar as regras do jogo, as nossas leis definem os resultados do jogo, chegando ao cúmulo de a Carta Magna estabelecer o valor da hora extra, do abono de férias e de vários outros benefícios que, nos países avançados, são objeto de negociação.
Quando tudo é minuciosamente detalhado na lei, é óbvio, as chances de ocorrerem desvios da lei são enormes. No Brasil, toda e qualquer infração trabalhista é motivo de ações judiciais que, tendo chegado a 2,5 milhões (!), entopem as Juntas de Conciliação e Julgamento e os Tribunais do Trabalho.
Não há quem aguente acompanhar o crescimento do conflito trabalhista no Brasil. Os juízes trabalham muito e estão sempre atrasados na sua agenda. As partes esperam demais e duvidam que essa seja a melhor maneira de fazer justiça.
Se há algo de errado com o atual sistema trabalhista, isso reside mais no campo da lei do que da Justiça. Esta faz o que a lei manda fazer. Se a lei é instigadora de conflitos, está na hora de mudar a lei para, então, elevar a cooperação, desafogar a Justiça e valorizar os seus julgamentos.
O Brasil precisa de leis que estimulem o entendimento e uma Justiça do Trabalho que se incumba apenas dos conflitos jurídicos, e não econômicos.
Se enxugarmos a lei e circunscrevermos a competência da Justiça, a negociação será estimulada e o Brasil entrará na rota das nações mais avançadas, nas quais a vontade das partes é soberanamente respeitada.
Portanto, não se trata de saber se vamos continuar ou acabar com a Justiça do Trabalho, mas sim se vamos continuar ou parar de alimentar essa legislação anacrônica que prejudica o emprego dos trabalhadores e a competitividade das empresas, sem falar nos prejuízos causados ao Estado por 57% de brasileiros que trabalham no mercado informal, usando os serviços do SUS e do INSS, sem nada contribuir para eles.
O que está em jogo é o conjunto das instituições trabalhistas, e não apenas a Justiça do Trabalho. Chegou a hora de ampliar o debate e redefinir as suas responsabilidades.


Antonio Ermírio de Moraes escreve aos domingos nesta coluna.


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