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CARLOS HEITOR CONY
Marcito
RIO DE JANEIRO - "Pendurada a
espada, os velhos marechais deveriam recolher-se a particulares limbos de glória, cercados da ternura
de suas famílias e do silêncio de
seus concidadãos. Pendurada a espada, os velhos marechais deveriam
cristalizar-se como estátuas dignas,
merecedoras do respeito dos que
por elas passam, mas sem perturbar
o fluxo de vida que lhes corre nos
pés. Ao fim de uma vida árida e dura, o silêncio é o que lhes convém. E
à nossa paciência também".
Este é o final da crônica de Marcio Moreira Alves publicada no
"Correio da Manhã" de 7 de maio de
1964, em cima do golpe daquele
ano. Marcito comentava uma entrevista do marechal Odílio Denys,
um dos esteios do poder militar que
se instalava no país. Em dezembro
de 1968, como deputado federal, faria o discurso que serviria de pretexto para o AI-5.
Já não falava diretamente aos
marechais, mas aos cadetes de maneira geral, relembrando de certa
forma a greve das mulheres de Atenas que se negavam aos covardes da
ocasião.
Quando seu primo, Afonso Arinos, telefonou-me para dar a notícia de sua morte, eu já perdera o
prazo de mudar minha crônica de
domingo. Gostaria de escrever mais
e melhor sobre a amizade que nos
uniu, nas redações, nas celas da PE,
no dia a dia de uma convivência em
que conheci um dos homens mais
puros e possuídos no seu amor à
justiça.
O golpe de 64 contou com o apoio
da sociedade e da mídia. Marcito foi
a brilhante exceção que, após uma
tarefa profissional em Recife, escreveu a série mais tarde publicada em
livro: "Torturas e Torturados".
Foi um divisor de águas. A partir
das denúncias de Marcito, ninguém
teria o direito de ignorar o que se
passava e que aumentou com o
tempo e o modo.
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