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DA LENIÊNCIA
A notícia sobre uma suposta
cobrança de propina na privatização da Vale do Rio Doce, publicada
na revista "Veja", faz ressurgir uma
marca ruim da Presidência de Fernando Henrique Cardoso. Sempre a
pretexto de garantir a governabilidade, FHC fez concessões excessivas,
deixando passar incólumes indícios
de desmandos em seu governo. Aos
gestos em favor do esclarecimento
das suspeitas, o presidente muitas
vezes preferiu negociar o "enterro"
de escândalos. Mas as feridas mal cicatrizadas por esse modo de fazer
política não cessam de reaparecer de
tempos em tempos. É o caso agora,
com potencial de repercussão negativa para a candidatura situacionista.
O núcleo do governismo se defende argumentando que há um complô para desestabilizar a candidatura
presidencial do senador José Serra. O
uso dessa tática por políticos acusados de irregularidades é recorrente.
Recentemente, dela se valeu, sob pesadas críticas dos tucanos, o grupo
de Roseana Sarney no episódio Lunus. Se há conspiração contra Serra,
um observador isento diria que ela
não existiria sem a contribuição ativa
de dois correligionários do pré-candidato do PSDB.
Sem a participação do ministro da
Educação, Paulo Renato Souza, e do
ex-ministro das Comunicações Luiz
Carlos Mendonça de Barros, a notícia que liberou do armário da privatização mais um "esqueleto" não teria
sustentação. Eles confirmaram ter
ouvido a história de que Ricardo Sérgio de Oliveira, diretor do Banco do
Brasil à época da venda da Vale, teria
cobrado do empresário Benjamin
Steinbruch uma propina de R$ 15
milhões para montar o consórcio
que arrematou a mineradora.
Outra nota preocupante do episódio é a informação, confirmada por
Paulo Renato e por Mendonça de
Barros, de que o presidente Fernando Henrique Cardoso soube da suposta cobrança de propina ainda em
1998. Ao que consta, nenhuma providência foi tomada por parte do Executivo a fim de esclarecer o assunto.
Ricardo Sérgio de Oliveira permaneceu no seu estratégico cargo no Banco do Brasil.
Oliveira só perdeu o posto -em
companhia de Mendonça de Barros
e do ex-presidente do BNDES André
Lara Resende- quando vieram a público, ilegalmente gravadas, conversas telefônicas entre altas autoridades federais que denotavam manobras de bastidores com o intuito de
interferir na formação de consórcios
para o leilão da Telebrás.
Carentes do devido controle público e da devida transparência, muitas
etapas da venda de grandes empresas ao setor privado se passaram no
subsolo do poder. Esse terreno é propício às chantagens, à corrupção,
aos "grampos" ilegais e a outros golpes baixos -tudo à custa do contribuinte. E esse terreno é sobejamente
cultivado pelos compromissos que
os candidatos firmam em suas campanhas em troca de financiamento
comumente irregular.
O déficit de prestação de contas por
parte do poder público só se corrige
com pressão social. Ministério Público atuante, sociedade civil atenta e
jornalismo independente são fundamentais para que as instituições e os
políticos atuem com lisura. A suspeita de cobrança de propina na privatização da Vale é grave e não pode tornar-se mais uma a constar da lista de
escândalos do governo FHC varridos
para baixo do tapete.
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