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JOSÉ SARNEY
Não à colombização
EM 1985, ESTIVE com o presidente Reagan. Tratou-me
muito bem, mas não cedeu
nada. Nossa conversa versava sobre dívida externa, para nós impagável, e relações comerciais, em
que nos impuseram várias sanções.
Terminada a agenda bilateral, fiz
uma pergunta fora de qualquer formato diplomático: "Presidente, como o senhor entende a escolha da
Bolívia por Che Guevara para fazer
a revolução sul-americana?". Ele
não compreendeu a pergunta, e eu
mesmo respondi: "Presidente, não
foi por amor à Bolívia, mas por sua
posição geopolítica. É um país pobre, sem condições de sustentabilidade. Na realidade, dois países: o
do altiplano e o das zonas baixas.
Qualquer instabilidade ali se espalhará como fogo a todos os países
da região. Precisamos ajudar a Bolívia fortemente, e o Brasil não se
negará a participar desse esforço".
Não comovi o presidente dos Estados Unidos. Felizmente, depois
de alguns tropeços sérios, a Bolívia
está relativamente estável, embora
as ameaças de divisão estejam
latentes.
Lembro estes fatos para dizer
que o Brasil, com sua grandeza,
tem de pagar por ela e não pode
deixar que se forme em seu entorno qualquer fonte de instabilidade
e ameaça. É com estes olhos e com
algum receio que vejo o que acontece no Paraguai. O começo de um
processo que já aconteceu no Peru
e na Colômbia.
O chamado Exército do Povo Paraguaio não pode se transformar
numa Farc ou num Sendero. Com
determinação e força, o Brasil deve
ajudar o presidente Lugo a manter
a ordem no seu país e não permitir
jamais que nossas fronteiras sejam
violadas, para evitar essa conjugação infame de guerrilha com
narcotráfico.
O Brasil, graças a seu povo, manteve-se fora desse caldeirão. Aqui,
os narcos não conseguiram se infiltrar nas Forças Armadas, na Justiça, no governo ou nas polícias. Mas
no México era assim e, de repente,
ele está a colombizar-se. Leio estarrecido uma entrevista de Samper, "scholar" e cientista político,
ex-presidente da Colômbia, que faz
esta profecia: "Nenhum país da
América Latina pode sentir-se livre do narcotráfico. O Brasil, em
poucos anos, será um grande consumidor, centro de tráfico e produtor de narcóticos". É de alarmar,
mesmo que sejam palavras sem
fatos.
Temos certo frenesi político em
alguns países do continente. O Brasil não deve vacilar. Deve adverti-los de que não devem acirrar suas
divergências abrindo espaço para
misturar política e cocaína. Este
problema será um dos que ameaçam a sobrevivência da humanidade, junto com as armas nucleares.
Como diziam os gregos, não devemos erguer estátuas a Adrasteia,
a deusa da vingança. Tenhamos o
mesmo cuidado com as drogas.
jose-sarney@uol.com.br
JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras
nesta coluna.
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