São Paulo, segunda-feira, 07 de junho de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Medicamentos para o povo

ZILDA ARNS NEUMANN

É com muita esperança que costumo falar sobre o acesso aos serviços públicos de saúde com qualidade e acolhimento. É uma caminhada em direção ao direito constituído de todas as classes sociais no Brasil.
Como a absoluta maioria dos problemas, de todas as ordens, começa em casa e/ou na comunidade, é bem mais fácil resolvê-los se as alternativas de solução estiverem próximas, acessíveis às pessoas. É por isso que os serviços de saúde, para serem considerados adequados, devem contemplar ações de promoção da saúde, prevenção, cura e recuperação das doenças, além de serem de boa qualidade, humanizados e acessíveis a todos.
O acesso a medicamentos necessários para tratar as doenças e prevenir o sofrimento humano faz parte do ciclo da solução dos problemas e do restabelecimento da saúde. Sendo assim, a iniciativa do Ministério da Saúde de criar a Farmácia Popular do Brasil, apresentada pelo ministro Humberto Costa ao Conselho Nacional de Saúde como um dos itens do Plano Nacional de Assistência Farmacêutica, na reunião plenária do dia 7 de maio último, aprovada com uma só abstenção, representa um grande avanço do SUS.
O Plano Nacional de Assistência Farmacêutica não pode ser concebido como simples atendimento da demanda de medicamentos gerada nos serviços, mas sim como parte integrante da política nacional de saúde, envolvendo um conjunto de ações intersetoriais voltadas à saúde, tendo o medicamento como um dos insumos essenciais.
Nesse contexto, a 1ª Conferência Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica, que aconteceu de 15 a 18 de setembro de 2003, em Brasília, definiu as diretrizes a serem adotadas no país, a partir da busca de consensos entre os diferentes segmentos envolvidos na questão, para garantir o direito da população à assistência farmacêutica como parte integrante da política de saúde do Brasil.


Os medicamentos serão fornecidos a preço de custo, tornando-se acessíveis aos brasileiros de renda média
Órgão máximo de decisão sobre as políticas de saúde a serem implementadas pelo governo, o Conselho Nacional de Saúde, que reúne usuários do sistema, trabalhadores da saúde, prestadores de serviço e governo, entendeu que as unidades da Farmácia Popular vão permitir que milhares de brasileiros, hoje impossibilitados de dar continuidade aos tratamentos de saúde por razões financeiras, comprem remédios com preços muito abaixo dos cobrados nas farmácias convencionais.
Na Farmácia Popular do Brasil, os medicamentos serão fornecidos a preço de custo, tornando-se acessíveis aos brasileiros de renda média e que dispõem de poucos recursos para compra-los em outras farmácias. Essa iniciativa não deverá prejudicar o acesso a medicamentos dos mais pobres, que continuarão obtendo os remédios essenciais nos postos de saúde, como acontece hoje. É preciso destacar que a Farmácia Popular servirá a qualquer brasileiro, e não a segmentos da população. Com isso, além de distribuir remédios gratuitos à parcela da população que procura o SUS, o Ministério da Saúde abre uma outra frente de assistência farmacêutica, com verba extraordinária, especialmente conquistada para essa finalidade.
Gradualmente, a Farmácia Popular do Brasil vai fornecer medicamentos que atendam a 95% das prescrições. São remédios contra hipertensão, diabetes, asma, tosse e dor, antibióticos, antiinflamatórios, anticonvulsivos, soro hidratante oral e outros de uso contínuo e de consumo amplo. Os remédios serão fornecidos apenas para portadores de receita médica, a fim de evitar a automedicação.
Na primeira etapa do projeto de farmácias populares, uma maior atenção será dada às necessidade dos portadores de hipertensão e diabetes. Esse empenho servirá para ampliar o acesso dos pacientes a esses medicamentos. No Brasil vivem cerca de 16,8 milhões de hipertensos. Destes, 85% precisam de remédios. O subsídio amplia o acesso a sete medicamentos para 3,5 milhões de pacientes hipertensos.
A diabetes atinge 3,9 milhões de brasileiros, sendo que, destes, cerca de 700 mil necessitam de tratamento com insulina. O SUS é responsável pelo atendimento de 70% desses pacientes. As unidades de farmácias populares vão disponibilizar o medicamento a todos os pacientes que atualmente o adquirem em farmácias privadas, ampliando o acesso à insulina para outros 30% de portadores de diabetes.
A Farmácia Popular do Brasil será implantada juntamente com diversas outras estratégias complementares. Terá uma rede operada pela Fundação Oswaldo Cruz e desenvolverá um modelo a ser transferido a Estados e municípios que quiserem implantar programas semelhantes.
As Santas Casas, os hospitais filantrópicos, os hospitais universitários e outros parceiros do SUS são convidados a aderir ao projeto.
A operacionalização da Farmácia Popular do Brasil é um grande desafio, que merece o apoio de todos nós. Será preciso aperfeiçoá-la sempre mais, à medida que for sendo implantada nos municípios, tendo sempre, como meta única, o bem-estar do povo.


Zilda Arns Neumann, 68, fundadora e coordenadora nacional da Pastoral da Criança, é conselheira titular da CNBB no Conselho Nacional de Saúde, membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e membro do Conselho de Segurança Alimentar.


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