São Paulo, terça-feira, 07 de julho de 2009

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Quem paga a conta

Ao sugar lucro de estatais a fim de diminuir déficit fiscal, governo sacrifica investimentos, cruciais para crescimento maior

EMPRESAS estatais eram válvula de ajuste recorrente do governo na época de inflação elevada. No afã de inibir a marcha dos preços, o Executivo adiava reajustes de tarifas, ou os concedia em índices inferiores ao da alta inflacionária. O malabarismo podia evitar corrosão mais acentuada no custo de vida em curto prazo, mas dilapidava a capacidade de investimento dessas empresas e, assim, prejudicava a modernização da infraestrutura do país.
O fim da inflação alta, as privatizações e a instituição de regimes realistas de fixação de tarifas praticamente eliminaram essa prática no Brasil. Mas as estatais continuam prestando serviços indevidos ao ajuste das contas públicas, como mostrou ontem reportagem desta Folha.
A fim de custear a aceleração das despesas com a máquina federal, o Planalto, nos 12 meses terminados em maio, duplicou os saques das suas empresas estatais. Como controlador dessas companhias, o Tesouro pôde elevar o volume dos lucros das estatais que foi destinado ao erário, sob a forma de dividendos. De cada R$ 100 poupados pelo governo no chamado superávit primário entre junho de 2008 e maio de 2009, R$ 44 vieram das estatais.
Embora os tempos sejam outros, a escolha do Executivo tem implicações semelhantes às decisões populistas do passado. Quanto maior o saque governamental, menor a quantia de lucros a ser canalizada para novos investimentos das estatais. O sacrifício das despesas em infraestrutura poderia ser neutralizado caso o governo utilizasse o recurso extra obtido com os dividendos para ampliar seus próprios desembolsos em saneamento, habitação e transportes.
O que vai a galope, porém, são gastos públicos que se transformam em consumo, e não em investimento. O desembolso federal com folha de pagamentos, aposentadorias, pensões e outros benefícios cresceu 12% nos primeiros cinco meses de 2009. Como a arrecadação de impostos caiu 6%, o Planalto sugou mais lucros das estatais na tentativa de evitar um rombo fiscal.
Além disso, o governo Lula baixou pela segunda vez no ano a sua meta de superávit primário em 2009, de 2,5% para 1,85% do PIB. Desse modo, o presidente da República e a aspirante que tirou do bolso do colete, a ministra Dilma Rousseff, puderam reiterar sua disposição de ampliar ainda mais o comprometimento do erário com despesas duradouras de consumo. Falam em manter a nova rodada de aumentos prometida ao funcionalismo e a correção dos benefícios do Bolsa Família.
Num país que já destina ao governo, a título de tributos, quase 40% do que produz, toda decisão de aumento de gastos públicos setoriais, por mais justa que seja, continua sendo feita à custa do contribuinte, da capacidade produtiva e das futuras gerações. Nada de encontrar no próprio gigantismo da máquina estatal, promovendo corte de gastos e ganhos de eficiência, a margem para os novos dispêndios.


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