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JOÃO SAYAD
Distribuições normais
FUNDAMENTALISTAS sofrem
de uma esperança desesperada de que alguma coisa ou
uma coisa só termine de vez com
medo e sofrimento. Em tempos de
paz e prosperidade, não são importantes. 90% da população é moderada e pertence ao centro. Os fundamentalistas -neoconservadores
americanos, Hizbollah do Líbano,
Hamas da Palestina e falcões de Israel- representam no máximo
10% do total, distribuídos igualmente à direita e à esquerda. A distribuição é normal, mas precária.
Pois medo e sofrimento podem
alterá-la radicalmente. Depois do
11 de Setembro, a popularidade do
presidente Bush aumentou. Em Israel, 80% da opinião pública concorda que se matem cinco civis para cada guerrilheiro. O Hizbollah
tende a ser maioria no Líbano. Libaneses moderados partirão em
diáspora como os judeus. Uma única população se dividirá em duas,
de espécies diferentes, como jacarés e lagartos. O que hoje chamamos de Líbano desaparecerá.
Somos 190 milhões de brasileiros. Produzimos R$ 2 trilhões por
ano. A renda média de cada família
é de R$ 4.000 por mês. Na realidade, a maioria dos brasileiros ganha
R$ 300 ou menos por mês. Já somos duas espécies diferentes -os
ricos e os pobres- que vivem no
Brasil em lugares diferentes e não
casam entre si. A média é um mito.
A taxa de inflação é outro mito.
Quando a inflação era de 40% ao
ano, no primeiro choque de petróleo, em 74, a gasolina subia 60% ao
ano enquanto a maioria dos preços
subia 20%. Nenhum preço subia à
taxa média. Se a inflação for 4%
ao ano, a mesma coisa acontece
com menos intensidade: alguns
preços crescem a 5% e a maioria
cresce a 3%.
Por isso, os juros reais são muito
maiores do que 10% para as empresas competitivas e menores -feirantes, camelôs, bóias-frias, agricultores, confecções, indústria têxtil, de alimentos e outras cujos preços crescem abaixo da média.
Para as empresas grandes, o juro
real tende a ser menor do que 10%.
E, em geral, elas têm acesso a financiamento internacional. Quando os juros aumentam, as empresas competitivas enfrentam dificuldades para sobreviver. As grandes param de investir, demitem e
compram títulos da dívida pública.
Um desastre.
O último Copom concluiu que os
juros nominais caíram muito, embora os juros reais tenham subido.
Será que vão parar de reduzir os juros? Continuaremos a crescer pouco e a empregar pouco. Pequenas
empresas sobreviverão sonegando
impostos. A agricultura continuará
em crise. Os dois países ficarão
mais distantes: o país "corporate"
na Vila Olímpia, e o PCC, nas zonas
sul e leste. No futuro, em alguma
eleição, aqui também, vencerá o
Hizbollah.
jsayad@attglobal.net
JOÃO SAYAD escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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