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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Plano Diretor de São Paulo contribuirá para a melhoria do trânsito na cidade?
NÃO
Sinfonia inacabada
JOSEF BARAT
Merece louvor a iniciativa do
Executivo municipal em encaminhar à aprovação da Câmara de vereadores o projeto de lei que instituiu o Plano Diretor Estratégico e o Sistema de
Planejamento e Gestão do Desenvolvimento Urbano do Município.
É um fato auspicioso a firme retomada da preocupação com o futuro da cidade de São Paulo e com a sua inserção
metropolitana após quase uma década
de esvaziamento dos núcleos de inteligência para a formulação de estratégias
de longo prazo e de desmantelamento
dos mecanismos de planejamento.
Mas, se a iniciativa da prefeitura merece elogios, as mudanças oportunistas
ocorridas na tramitação do projeto de
lei na Câmara inspiram preocupações.
Restringindo-me à questão dos transportes, creio ser oportuno expor algumas delas.
De início, não há reparos a fazer na
formulação e nos conceitos apresentados na subseção 3, "Da Circulação Viária e Transportes", do texto aprovado.
Trata-se de um conteúdo abrangente e,
sobretudo, consistente, retomando, numa linguagem mais atual, os objetivos,
diretrizes e ações estratégicas em voga
nos anos 70. Que, aliás, foram abandonados nas duas últimas décadas pelo retrocesso sofrido nas atividades relacionadas com planejamento de longo prazo nos três níveis da administração pública, pelo fato de termos nos tornado
reféns das políticas de curto prazo formuladas, recorrentemente, para conter
as crises inflacionárias e financeiras.
Para dar um exemplo, é correta a diretriz exposta no artigo 83, inciso III, do
Plano Diretor de adequar "a oferta de
transportes à demanda, compatibilizando seus efeitos indutores com os objetivos e diretrizes de uso e ocupação do
solo, contribuindo, em especial, para a
requalificação dos espaços urbanos e
fortalecimento de centros de bairros".
Mas essa diretriz se torna inócua,
quando modificações arbitrárias nos
zoneamentos e nos índices de ocupação
do solo acabam por impor uma geração
de tráfego incompatível com a capacidade do sistema viário. O adensamento
ou a criação de corredores comerciais
ao sabor de interesses político-eleitorais
e empresariais agrava, sem dúvida, os
problemas de circulação e congestionamento. E as mudanças impostas pela
Câmara acarretarão esses problemas
Por outro lado, sabe-se que o transporte de massa é forte indutor da estruturação do espaço urbano, promovendo adensamentos e direcionando a expansão das cidades. O transporte sobre
trilhos (metrô e trens metropolitanos) e
de ônibus em corredores estruturais deve responder às exigências da demanda
existente, mas a ampliação da oferta
acaba também por reconfigurar e condicionar a demanda futura.
Por isso, os adensamentos ao longo
dos eixos ou corredores de transporte
de massa devem ser planejados e tornarem-se compatíveis com a capacidade
de transporte oferecida. Assim, devemos estar atentos a dois problemas:
1 - O Estado e a prefeitura devem se
entender quanto ao potencial, limites e
regras do processo de adensamento;
2 - A prefeitura (responsável pelo
transporte por ônibus e pela circulação
e trânsito) deve impedir que alterações
indevidas de zoneamento criem estrangulamentos na oferta de espaço viário
ou restrições na disponibilidade do
transporte coletivo.
Os adensamentos, quando planejados
e coordenados com a oferta do transporte, permitem um melhor aproveitamento de espaços que já dispõem de infra-estruturas e, portanto, uma redução
nos custos da urbanização.
A liberação de corredores comerciais,
as alterações nos índices de ocupação e
as chamadas Operações Urbanas, por
sua vez, podem contribuir para a revitalização de áreas estagnadas ou decadentes. Tudo isso é verdade. Mas, se já na
aprovação do Plano Diretor na Câmara
as mudanças foram feitas sem planejamento e ao sabor de interesses dos vereadores -dando ensejo, por exemplo,
à criação de pólos geradores de tráfego
em áreas onde a não infra-estrutura viária para tanto-, com certeza teremos
problemas de circulação e transporte no
futuro imediato.
E, se a implantação de uma linha de
metrô, por sua vez, dá oportunidade a
uma especulação desenfreada com terrenos, com a apropriação exclusivamente privada da "mais valia" gerada
por um investimento público, aí a questão se torna ainda mais grave.
No caso dos transportes, o Plano Diretor e o Sistema de Planejamento e Gestão do Desenvolvimento Urbano correm o risco de se tornar movimentos de
uma sinfonia inacabada. Isto, se não forem estabelecidos mecanismos institucionais rigorosos que propiciem a coordenação de programas e projetos entre
prefeitura e Estado.
Josef Barat, 62, economista, é membro do Conselho de Economia, Sociologia e Política da Federação do Comércio do Estado de São Paulo. Foi
secretário de Transportes do Estado do Rio de Janeiro (governos Faria Lima e Moreira Franco) e
presidente da Empresa Metropolitana de Transportes do Estado de São Paulo (1979-80).
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