São Paulo, sábado, 07 de setembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TENDÊNCIAS/DEBATES

O Plano Diretor de São Paulo contribuirá para a melhoria do trânsito na cidade?

SIM

O plano e o transporte

AILTON BRASILIENSE PIRES e EDUARDO VASCONCELLOS

O novo Plano Diretor de São Paulo, no que diz respeito ao transporte público e ao trânsito, constitui um avanço significativo em relação aos planos anteriores. No entanto a implantação da infra-estrutura e dos esquemas operacionais necessários dependerá de projetos e ações posteriores, e de recursos cujas fontes ainda não estão claras.
O Plano Diretor aborda e trata adequadamente os principais fatores que estão por trás dos problemas do transporte e do trânsito e faz propostas coerentes e viáveis na maioria dos casos.
O plano acerta ao dar ênfase à necessidade de controlar ou induzir o uso e a ocupação do solo urbano, que têm relação direta com a geração de viagens de pessoas e mercadorias. Acerta também na proposição de intervir para reduzir a necessidade dos deslocamentos. Parte importante dessas ações é a proposta de requalificação de avenidas e corredores de transporte público, com a criação de áreas de intervenção urbana ao longo dos eixos. Também importante é a obrigatoriedade de propor nova lei sobre os pólos geradores de viagem em 180 dias.
Resta, no entanto, a dúvida sobre a alteração efetiva da concentração de empreendimentos nas áreas mais ricas do município (sul e sudoeste), um dos maiores fatores para o grande crescimento dos congestionamentos, bem como a mudança dos desequilíbrios nos tipos de ocupação urbana, da qual a zona leste é caso exemplar.
Na parte específica do transporte coletivo, é proposto que ele garanta uma mobilidade mais democrática, com ênfase para as necessidades da população de baixa renda. Embora as propostas da rede integrada e do bilhete único constituam grande avanço, o ponto nevrálgico aqui será o valor final das tarifas de ônibus e a forma de integração tarifária entre os vários modos de transporte do município e da região metropolitana, desafio até hoje presente.
Por outro lado, o comprometimento do município na viabilização de recursos para o metrô e as ferrovias é uma proposta essencial, embora devesse ser estendida para o caso dos corredores metropolitanos de ônibus. No entanto, embora o Fundo de Desenvolvimento Urbano inclua o transporte coletivo como um de seus beneficiários, o elevado custo da infra-estrutura e dos corredores de transporte requer uma posição mais enfática sobre a obtenção de recursos exclusivos, por um longo prazo.
Outro desafio, o de convencer os usuários de automóvel a usar o transporte coletivo, está tratado pela oferta de serviços especiais de ônibus. Embora a proposta seja correta, estudos recentes feitos pela ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos) mostram que a degradação do transporte coletivo criou grandes barreiras psicológicas nas pessoas, sendo necessária uma verdadeira revolução na qualidade para atrair os usuários de automóveis (e manter os passageiros atuais que têm alternativa de transporte).
No caso dos usuários de automóveis, essa atração pode ser induzida pela aplicação de sanções pecuniárias -como o pedágio urbano, previsto no Plano Diretor-, mas sua aplicação tem obstáculos políticos difíceis de transpor.
Outro grande avanço é a proposta de condicionar a expansão do sistema viário principalmente às necessidades do transporte coletivo, revertendo práticas históricas extremamente nocivas à cidade, de apoio explícito ao uso do automóvel. No entanto a abertura dada pelo plano à construção de viadutos e passagens em desnível precisa ser exercida com extremo cuidado, para não invalidar o princípio essencial de beneficiar a maioria que usa o transporte coletivo.
Na área do meio ambiente, o plano determina a implantação de programa de controle de emissões veiculares, componente essencial de uma política ambiental. Porém aqui há um equívoco que deriva de uma percepção distorcida da realidade: o plano enfatiza a necessidade de reduzir as emissões dos veículos de transporte coletivo, sendo que a maior parte do problema deriva dos automóveis, caminhões e motos.
O gravíssimo problema dos acidentes de trânsito é tratado de forma mais difusa e menos incisiva, embora o plano afirme a necessidade de reduzir acidentes e mortes no trânsito e de defender melhores condições de circulação para pedestres, idosos, portadores de deficiência física e crianças.
Finalmente, a proposta de regionalização dos planos de transporte e trânsito é adequada e compatível com a recente descentralização administrativa, constituindo instrumento importante para a democratização das decisões e para gerar ações de maior qualidade. Mas será necessário trabalhar o conflito inerente entre as necessidades locais e aquelas das macrorregiões.


Ailton Brasiliense Pires, 56, engenheiro de transporte e trânsito, é diretor-executivo da ANTP e membro do Conselho de Assuntos Metropolitanos da Prefeitura de São Paulo. Eduardo Alcântara de Vasconcellos, 49, engenheiro civil e sociólogo, é diretor-adjunto da ANTP.



Texto Anterior:
TENDÊNCIAS/DEBATES
O Plano Diretor de São Paulo contribuirá para a melhoria do trânsito na cidade? - Não - Josef Barat: Sinfonia inacabada

Próximo Texto:
Painel do Leitor

Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.