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DEMÉTRIO MAGNOLI
O sentido do voto nulo
A CAMPANHA pelo voto nulo,
difundida pela internet, não
tem potencial para afetar a
eleição presidencial, mas pode repercutir profundamente na eleição
para o Congresso. Apesar do que
imaginam seus proponentes, ela
presta um serviço inestimável ao
"lulismo".
É preciso distinguir o petismo do
"lulismo". O primeiro, oriundo dos
movimentos sociais, configurou
uma oposição parlamentar ativa e
eficiente, ganhando a confiança de
um amplo eleitorado urbano de
trabalhadores, jovens e profissionais qualificados. O segundo é um
fenômeno mais recente, que só se
consolidou com a chegada de Lula
ao Planalto. A sua marca singular é
um salvacionismo conservador,
ancorado no assistencialismo, que
despreza o Parlamento e busca
corrompê-lo.
O antiparlamentarismo de Lula
ficou expresso antes da conquista
do Planalto, na célebre tirada sobre
os "300 picaretas" do Congresso.
Era uma denúncia vazia e irresponsável, desacompanhada de nomes e indícios, que não obteve respaldo da bancada petista. Depois,
já com Lula na Presidência, o petismo desfigurou-se em "lulismo",
rendendo-se às delícias do poder e
alienando sua base social.
A saga do mensalão foi uma decorrência necessária do salvacionismo lulista, não um episódio fortuito. Se o Congresso não tinha
"300 picaretas", era preciso produzi-los para libertar o "salvador da
pátria" dos constrangimentos democráticos impostos pelas instituições republicanas. A corrupção
em massa de parlamentares, como
explica o procurador-geral, resultou da ação de uma quadrilha cujo
centro operacional situava-se fora
do Congresso, na Casa Civil.
Sob o "lulismo", a força da Presidência mantém relação direta, mas
de sinal invertido, com a do Parlamento. Quando a CPI dos Correios
desvendou o esquema de compra
de parlamentares, o Congresso conheceu uma efêmera primavera,
enquanto a imagem de Lula se degradava. Inversamente, quando o
Congresso entregou-se à farra da
absolvição dos "mensaleiros", o
presidente recuperou a aura perdida. A dança macabra da deputada
lulista Ângela Guadagnin, que tinha a finalidade prosaica de comemorar a absolvição de um "mensaleiro", não fez bem à sua carreira
nem a seu partido. Mas era uma celebração apropriada da desgraça do
Parlamento e, portanto, da vitória
do seu chefe político.
Uma hipotética enxurrada de votos nulos atingirá os parlamentares, de diferentes partidos, que lutam para restaurar a legitimidade
do Parlamento e dependem do
apoio da parcela informada da população. É um cenário de sonhos
para os políticos venais, que se alimentam do voto de clientela, e para
Lula, que se nutre da falência das
instituições.
magnoli@ajato.com.br
DEMÉTRIO MAGNOLI escreve às quintas-feiras
nesta coluna.
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